Virada Psicodélica https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br Novidades da fronteira da pesquisa em saúde mental Wed, 01 Dec 2021 01:26:07 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Cresce interesse de psicólogos por psicodélicos, mas estigma persiste https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/09/20/cresce-interesse-de-psicologos-por-psicodelicos-mas-estigma-persiste/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/09/20/cresce-interesse-de-psicologos-por-psicodelicos-mas-estigma-persiste/#respond Mon, 20 Sep 2021 20:09:41 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=646

Repare no vídeo acima: uma chamada para evento da SBPA (Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica), associação de psicanalistas junguianos. “Plantas de poder e outras substâncias psicoativas – Ciência e espiritualidade”, promete o título.

Junguianos talvez sejam a tribo psi mais propensa a se interessar por essas substâncias, afinal há entre eles uma tradição de estudo sobre o acesso ao inconsciente coletivo e seus arquétipos intermediado por psicodélicos, como relembrou James Harris no periódico Jama Psychiatry. Essa linhagem remonta aos anos 1950, com o analista Ronald Sandison, seguido pelo psiquiatra Stanislav Grof na Universidade Johns Hopkins.

O interesse extrapola o campo junguiano, contudo. Pipoca aqui e ali, entre psicólogos e psiquiatras, uma aproximação cautelosa com os compostos modificadores de consciência, após décadas de hegemonia da psicanálise refratária a medicamentos e da psiquiatria farmacológica fundada no conceito de desequilíbrio bioquímico (neurotransmissores).

Reemerge, assim, o emprego de psicodélicos para recuperar conteúdos psíquicos recalcados, como traumas, a serem elaborados depois na psicoterapia. A técnica chamada de “psicolítica” teve larga utilização até meados dos anos 1960, pelo menos, quando a reação proibicionista da Guerra às Drogas lançou LSD, psilocibina e MDMA no rol das drogas proibidas.

Alan Davis, da mesma Johns Hopkins e da Universidade do Estado de Ohio, pôs-se a campo para medir o interesse entre psicólogos. Constatou, conforme relata no artigo “Atitudes e Crenças sobre o Uso Terapêutico de Drogas Psicodélicas entre Psicólogos nos Estados Unidos”, uma disposição cautelosamente favorável ao uso, ainda que acompanhada de perene preocupação com riscos psiquiátricos e neurocognitivos.

Dito de outra maneira, o trabalho publicado no periódico Journal of Psychoactive Drugs indica que estigma persiste. Isso apesar do crescente corpo de estudos comprovando que o perigo de danos permanentes ao cérebro ou à saúde mental contido nos psicodélicos é diminuto, sobretudo se comparado ao álcool.

Não vai ser fácil desfazer a lenda urbana de que o LSD, por exemplo, abriria buracos no tecido cerebral. Ou que várias pessoas entrem em surto psicótico com o ácido, que viagens ruins sejam frequentes e que muitos “nunca voltariam”, mitos criados pela propaganda governamental americana com auxílio da imprensa sensacionalista no mundo todo.

Davis e seu grupo usaram um desenho complicado, “quase-experimental”, para obter pela internet respostas que permitissem tirar conclusões com significado estatístico de 366 psicólogos clínicos atuantes nos EUA. Mais de quatro quintos opinaram que intervenções apoiadas por psicodélicos merecem mais estudos, embora menos da metade concorde com a afirmação de que representem uma promessa para tratamento de transtornos psiquiátricos.

Ora, é precisamente isso que a pesquisa científica vem constatando. O MDMA (ecstasy) enfrenta testes clínicos de fase 3 para tratar transtorno de estresse pós-traumático, e há expectativa de que seja licenciado para isso até 2023. A psilocibina passa por ensaios clínicos contra depressão e, como o MDMA, entrou numa via rápida de aprovação pela FDA (a Anvisa dos EUA), como “breakthrough therapy”.

Pílulas de ecstasy (MDMA) usadas em baladas (Divulgação/DEA)

Os psicólogos entrevistados se mostraram duas vezes mais inclinados a alertar pacientes para riscos de tomar psicodélicos do que de praticar meditação, embora haja trabalhos indicando que o risco de efeitos psiquiátricos adversos é similar. Nos artigos sobre psicodélicos publicados na última década, não há notícia da ocorrência de psicose prolongada, comportamentos lesivos ou alterações persistentes de percepção.

A equipe de Davis conclui pela necessidade de educar e esclarecer psicólogos sobre os efeitos reais dos psicodélicos, até porque seu consumo só faz aumentar: “Dada sua sensibilidade e experiência no trabalho com questões de saúde mental, acreditamos que psicólogos são especialmente qualificados para apoiar clientes no processamento e na integração de experiências psicodélicas e para encorajar práticas vitais de redução de danos, assim como ajudar a guiar a implementação ética desses tratamentos em contextos clínicos e de pesquisa”.

O evento virtual da SBPA se propõe exatamente a isso, por meio de quatro meses redondas no final de novembro. Participarão algumas das figuras de proa da ciência psicodélica nacional, como o psiquiatra Dartiu Xavier, a antropóloga Bia Labate e o biomédico Eduardo Schenberg.

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A Fósforo Editora está dando 20% de desconto no livro “Psiconautas – Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira” para quem se inscrever no curso sobre drogas modificadoras da consciência no portal Bora Saber, que começa em 28 de setembro. Não perca essa chance de saber um pouco mais sobre o que a pesquisa está (re)descobrindo de benéfico e terapêutico em substâncias poderosas como psilocibina, LSD, ayahuasca, MDMA e ibogaína.

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Esquenta debate sobre a bagagem mística da ciência psicodélica https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/09/13/esquenta-debate-sobre-a-bagagem-mistica-da-ciencia-psicodelica/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/09/13/esquenta-debate-sobre-a-bagagem-mistica-da-ciencia-psicodelica/#respond Mon, 13 Sep 2021 12:20:43 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/09/Misticismo-300x151.png https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=608 Um ateu não militante, que respeita quem acredita e não tenta convencer ninguém do contrário, com frequência enfrentará dificuldade diante dos ecos do misticismo que reverberam no pavilhão do renascimento psicodélico. Sempre que ciência e metafísica se misturam, a primeira sai perdendo.

Foi uma satisfação, assim, topar com o artigo “Indo além do Misticismo na Ciência Psicodélica”, de James Sanders e Josjan Zijlmans, na ACS Pharmacology & Translational Science. Poucas vezes um resumo (abstract) desencadeou premonição tão forte de comunhão intelectual:

“A moldura do misticismo é usada para descrever experiências psicodélicas e explicar os efeitos de terapias psicodélicas. Discutimos riscos e dificuldades provenientes do uso científico de uma moldura associada com sistemas de crenças sobrenaturais ou não empíricas e encorajamos pesquisadores a mitigar esses riscos com um modelo desmistificado do estado psicodélico”.

Quem acompanha este blog sabe o quanto incomoda esse enquadramento místico, posto em questão aqui e aqui. Naqueles dois posts ficou claro que a associação também inquieta alguns especialistas do campo que se reabilita após décadas no limbo imposto pela Guerra às Drogas iniciada nos anos 1970.

Ilustração de Stefan Keller (Pixabay)

No centro do debate retomado por Sanders e Zijlmans há mais que esoterismo hippie e abertura das portas da percepção para realidades alternativas à estreiteza do American Way of Life que a indústria cultural espalhava pelo mundo –daí a contracultura. Nada há de errado nesse anseio por transcendência, mas o pressuposto de que drogas psicodélicas como o LSD de fato a propiciem oferece uma base pouco sólida para sua recondução à farmacopeia autorizada na saúde mental.

“Há um elefante na sala da moderna ciência psicodélica”, alerta o artigo: “Em periódicos científicos e pelos salões de toda conferência psicodélica, pesquisadores e terapeutas ensinam a importância das experiências místicas para a eficácia de terapias psicodélicas”.

Com efeito, quem já usou psicodélicos percebe bem como é tentador resvalar no vocabulário religioso, ou quase, quando se tenta descrever o estado intermediado por eles. A percepção de que algo importante está para acontecer, de estar na iminência de compreender significados elusivos, paz, tranquilidade, empatia, sensação de unidade com a natureza ou o cosmo, perda de referência no tempo e no espaço podem ser facilmente interpretadas como acesso a uma realidade última, superior, contato com o divino, com o domínio sagrado, e assim por diante.

Os problemas começam quando pesquisadores presumem ser possível medir, mais que descrever, essas vivências subjetivas e correlacionar sua intensidade mística com mudanças positivas de atitude e comportamento, como fez Roland Griffiths em 2006 num artigo famoso. Desenvolveu-se um questionário de experiência mística (MEQ, na abreviação em inglês), muito usado em estudos psicodélicos, inclusive no Brasil.

Ao aplicar o MEQ, o pesquisador pede que o participante indique seu grau de concordância ou discordância com frases como “tive uma experiência em que algo maior que eu parecia absorver-me” ou “nunca tive uma experiência na qual me sentisse como se todas as coisas estivessem vivas”. Na parte que avalia a qualidade religiosa da experiência, o vocabulário é explícito: “sagrado”, “divino”, “santo” etc.

Para Sanders e Zijlmans, isso faz pouco sentido quando se trata de medir fenômenos psicobiológicos, tal como se espera de cientistas naturais. Pior, o próprio instrumento enviesa as respostas ao fornecer para participantes a moldura conceitual e a terminologia para descrever vivências que lhes parecem quase impossíveis de pôr em palavras.

“O problema é exacerbado quando fenômenos de experiência mística são aglomerados com crenças místicas sobre o que experiências psicodélicas significam”, escrevem os pesquisadores da Universidade de Amsterdã. “Vemos evidência disso no ambiente cultural psicodélico do presente: serviços de retiro psicodélico e páginas de orientação psicodélica populares na rede estão usando a pesquisa científica para educar usuários iniciantes de psicodélicos sobre o poder terapêutico de experiências místicas.”

Sanders e Zijlmans argumentam que a integração de misticismo na pesquisa e na prática clínica arrisca criar expectativas e associações irrealistas e potencialmente problemáticas quando apresentada para leigos, incluindo grupos vulneráveis em busca de psicodélicos para problemas sérios de saúde mental.

Reprodução de Frontiers in Pharmacology/Neuropharmacology.

Seu desafio aos pesquisadores da área indica a necessidade de criar um modelo descritivo, baseado na neurociência cognitiva, que prescinda da terminologia mística ou religiosa e permita medir aspectos da experiência psicodélica que possam ser correlacionados com ganhos terapêuticos, ou até mesmo explicá-los. Um dos caminhos seria a teoria do cérebro entrópico proposta por Robin Carhart-Harris, de quem se podem ouvir explicações em linguagem comum neste podcast (em inglês).

Não vai ser fácil, mas a ciência existe precisamente para isso –dar conta do que não está imediatamente acessível aos nossos sentidos, conceitos e palavras. Com respeito às últimas, confesso que não foi nada trivial escrever sobre minhas próprias viagens, no livro “Psiconautas”, em termos desprovidos de bagagem mística, como convém a um ateu. É praticamente inescapável falar em “inefabilidade”.

Não sendo militante da descrença, respeitei, e talvez até tenha invejado, a rapidez com que entrevistados tomavam outro rumo. Há algo de profundamente poético em seu esforço de atribuir os mistérios da mente a poderes superiores, e a devida apreciação estética está na raiz de todas as formas de reverência. Mas há grandeza também na contemplação metódica de fatos, fenômenos e mensurações, como prescreve a ciência.

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Enquete global confirma força da ayahuasca contra álcool e drogas https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/08/08/enquete-global-confirma-forca-da-ayahuasca-contra-alcool-e-drogas/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/08/08/enquete-global-confirma-forca-da-ayahuasca-contra-alcool-e-drogas/#respond Sun, 08 Aug 2021 19:31:00 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/08/InnerVisionsCapa-300x186.png https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=560 Pesquisa na internet realizada por pesquisadores na Austrália, Brasil e Espanha atesta com base numa grande amostra aquilo que evidências anedóticas de igrejas da ayahuasca já indicavam: o chá psicodélico está diretamente relacionado com menor incidência de uso problemático de drogas, em particular o álcool.

O Projeto Ayahuasca Global colheu em 40 países testemunhos de 10.836 usuários do chá, dos quais 8.629 relataram uso de álcool ou drogas e foram incluídos na análise publicada em 25 de julho no periódico Drug and Alcohol Review. Dos oito autores, três atuam no Brasil: Emerita S. Opaleye (Unifesp), Luís Fernando Tófoli (Unicamp) e Nicole L. Galvão-Coelho (UFRN).

Alguns vão torcer o nariz para a ideia de tratar abuso de drogas com outra droga, mas a DMT da ayahuasca, o LSD e a psilocibina de cogumelos são especiais. Pouco tóxicos, não causam dependência química e estão de volta à pesquisa de tratamentos psiquiátricos, após meio século de proibicionismo, com o ímpeto de um renascimento psicodélico.

De depressão a anorexia, vários são os transtornos para os quais ensaios clínicos apontam aplicações terapêuticas promissoras. Tão promissoras que instituições acadêmicas como Imperial College, Johns Hopkins, Harvard, o hospital Mount Sinai e as universidades de Nova York e da Califórnia abriram centros de estudos específicos para psicodelia. Pipocam investimentos privados bilionários na novidade psicofarmacológica.

O centro mais recente surgiu em Melbourne, Austrália: Instituto Psychae, voltado a testes clínicos de compostos farmacêuticos para medicina psicodélica. Segundo noticiou o jornal The Sydney Morning Herald, o centro de pesquisa nasce com dotação de 40 milhões de dólares australianos (R$ 154 milhões) doados por empresa americana de biotecnologia que prefere não ser identificada.

O Psychae terá como co-diretores Jerome Sarris, da Universidade Western Sydney, e Daniel Perkins, da Universidade de Melbourne. Não por acaso são respectivamente primeiro e último autores do artigo na Drug and Alcohol Review sobre ayahuasca, pois a dimetiltriptamina (DMT, principal psicoativo do chá) está nos planos de ensaios clínicos do novo instituto, por exemplo para tratar transtorno de uso de drogas (abuso e dependência).

Testemunhos obtidos pela internet implicam vieses de seleção, pois usuários de ayahuasca com más experiências provavelmente estariam menos motivados a preencher uma série de formulários padronizados. O forte dessa enquete, por outro lado, está no tamanho avantajado da amostra e na composição multicultural.

A análise revelou que há correlação estatística significativa entre frequência no uso da ayahuasca e menor incidência de uso ou abuso de álcool e outras drogas. E mostrou que esse benefício de saúde mental independe, em certa medida, de beber o chá em rituais religiosos (embora o uso em contexto cerimonial pareça, sim, robustecer o efeito terapêutico).

A presença destacada de brasileiros entre autores e participantes não é coincidência. O estudo da ayahuasca foi facilitado aqui pela legalização do chá para uso religioso a partir de 2004, o que tornou o Brasil o terceiro maior produtor de pesquisas de impacto em ciência psicodélica.

O estudo brasileiro de maior repercussão foi justamente um teste clínico randomizado controlado por grupo placebo com ayahuasca para depressão resistente a medicamentos, de 2018. Chefiado por Dráulio Araújo e Fernanda Palhano-Fontes, o ensaio pioneiro contou com participação de Nicole Galvão-Coelho (todos da UFRN).

Nicole Leite Galvão-Coelho em seu laboratório na UFRN. (UFRN/Divulgação)

A fisiologista retornou há poucos meses de um sabático na Austrália. Sua especialidade são marcadores relacionados com transtornos, como inflamação, cortisol e BDNF (fator cerebral importante na formação de sinapses).

Nicole acaba de publicar artigo sobre os perfis bioquímicos em pacientes com diferentes estágios de depressão, de recém-diagnosticados àqueles que não melhoram com antidepressivos disponíveis. Esse detalhamento poderá ajudar na sintonia fina de terapias com substâncias como a ayahuasca (que normaliza níveis de cortisol em pacientes graves resistentes, por exemplo).

O time potiguar trabalha no planejamento de testes clínicos mais ambiciosos de psicodélicos, com as dificuldades usuais enfrentadas por pesquisadores brasileiros. Grupos da USP também preparam ensaios controlados com o psicodélico ibogaína para dependência química (crack e álcool), mas ainda não abriram recrutamento.

Com frequência este blog recebe consultas sobre oportunidades para participar desses estudos e, quem sabe, beneficiar-se dos efeitos terapêuticos que a ciência vem constatando. Não cabe aqui fazer qualquer recomendação, porque a maioria dos psicodélicos permanece proibida e porque não sou médico nem psicólogo. Psicodélicos não são panaceia emocional, têm contraindição para muitas pessoas e não estão isentos de efeitos adversos, como qualquer substância.

Dito isso, cabe assinalar que havia no final de 2020 pelo menos 70 testes clínicos de psicodélicos com registro ativo no mundo. Entre eles, 56 estavam recrutando voluntários ainda no mês passado.

Seria ótimo se a parceria de pesquisadores nacionais com o milionário Instituto Psychae da Austrália colaborasse para impulsionar mais e maiores ensaios como esses no Brasil, necessitado como está o país de sacudir a depressão galopante (para não dizer ruminante), e manter sua posição de destaque em ciência psicodélica.

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Universidade da Califórnia tem doação de US$ 6,4 mi para estudar psicodélicos https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/03/31/universidade-da-california-tem-doacao-de-us-64-mi-para-estudar-psicodelicos/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/03/31/universidade-da-california-tem-doacao-de-us-64-mi-para-estudar-psicodelicos/#respond Wed, 31 Mar 2021 19:34:56 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/03/neuroscape-239x215.png https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=394 O entusiasmo acadêmico com o chamado renascimento psicodélico ganhou adesão de peso nesta terça-feira (30): a Universidade da Califórnia em São Francisco (UCSF) criou uma divisão só para pesquisar essas drogas em seu centro de neurociência Neuroscape.  O financiamento inicial, obtido com doações privadas, é de US$ 6,4 milhões (cerca de R$ 36 milhões).

Parte desse valor, US$ 4 milhões, se destina à nova cátedra Ralph Metzner de Neurologia e Psiquiatria. Para ela foi designado, como diretor-fundador da divisão, o neurocientista britânico Robin Carhart-Harris, hoje a face mais conhecida desse campo de pesquisa biomédica voltado a encontrar alternativas para a psiquiatria tratar transtornos mentais como depressão.

Carhart-Harris deixa a direção do pioneiro Centro para Pesquisa Psicodélica do Imperial College de Londres, aberto em 2019 com dotação privada similar à que o atrai agora para a Califórnia. O pesquisador se notabilizou por imagens do cérebro de voluntários sob efeito de LSD e psilocibina, substância psicoativa de cogumelos que o Imperial College mostrou em estudo preliminar ser eficaz contra depressão.

Perguntei por email a Carhart-Harris sobre a razão de interromper a carreira no Imperial, pelo qual publicou mais de uma centena de artigos científicos em 11 anos. “Muito bem-sucedida, sim, mas menos em termos de promoção na carreira”, respondeu o neurocientista. “Ofereceram-me algo incrível na UCSF, a cátedra com dotação sendo particularmente atraente.”

“Ainda tenho estudos importantes em curso no Imperial, mas espero produzir neurociência realmente bacana, ciência interdisciplinar entre medicina e tecnologia, na UCSF. A expertise em tecnologia do Neuroscape é particularmente animadora. Ah, sim, e o tempo na área leste da baía [de São Francisco], onde pretendemos nos estabelecer!”

O Imperial puxou uma fila que não cessa de aumentar. Em seguida viria o Centro para Pesquisa de Psicodélicos e Consciência da Universidade Johns Hopkins, o mais bem-dotado (US$ 17 milhões). Depois, a Universidade de Nova York (NYU), os hospitais Mount Sinai e MassGeneral/Harvard.

Hospital Mount Sinai em Nova York (REUTERS/Mike Segar)

A doação para a cátedra Metzner homenageia o companheiro de Timothy Leary e Richard Alpert no Projeto Psilocibina, criado em 1960 para estudar psicodélicos na mesma Universidade Harvard que agora retoma o veio de pesquisa. O grupo controverso acabou expulso da universidade, e Leary se tornou a partir daí o “guru do LSD” e inimigo número 1 na Guerra às Drogas deflagrada em 1971 por Richard Nixon, que lançou os psicodélicos no ostracismo.

Os US$ 4 milhões doados à vaga aberta para Carhart-Harris na UCSF partiram de outras figuras polêmicas, Ekaterina Malievskaia e George Goldsmith, da empresa Compass Pathways. A companhia realiza testes clínicos para obter para obter aprovação da psilocibina no tratamento de depressão e atua agressivamente para patentear o uso do psicodélico em terapia.

“Como um dos destacados cientistas desta geração, estamos satisfeitos que Robin Carhart-Harris seja o primeiro beneficiário dessa cátedra. Estamos confiantes de que ele e a equipe do Neuroscape continuarão avançando a inovação para transformar o cuidado em saúde mental”, declarou Goldsmith.

Robin Carhart-Harris (Divulgação)

“Nossos generosos financiadores estão tornando possível um grande salto à frente na geração de eficácia e segurança clínica para indivíduos no uso de psicodélicos para tratar uma ampla gama de condições de saúde mental, incluindo depressão, ansiedade, TEPT [transtorno de estre pós-traumático] e dependência química”, afirmou em comunicado da UCSF Adam Gazzaley, diretor do Neuroscape, a unidade interdisciplinar que se dedica a aproximar a neurociência da tecnologia.

A nova divisão da UCSF no Neuroscape atuará no que se diagnosticou como carência de estudos para otimizar a administração de psicodélicos, uma vez que os testes clínicos preliminares até aqui só teriam focalizado sua comparação com placebo. A ideia é monitorar dados fisiológicos, neurológicos e psicológicos para determinar a influência de vários fatores sobre o resultado terapêutico, como condições prévias do paciente, ambiente de terapia, decoração, música etc. –o que na literatura psicodélica ficou conhecido como set e setting.

“Essa pesquisa nos permitirá entender se um tratamento particular está bem adequado a um indivíduo, monitorando em tempo real como uma experiência [psicodélica] se desenrola”, disse no comunicado Jennifer Mitchell, professora da UCSF que lidera ensaios sobre MDMA (ecstasy) para tratar TEPT. “Nós miramos em ajustar dinamicamente elementos chave do contexto de uma maneira que guie os pacientes a uma experiência otimizada, assim maximizando benefícios positivos sustentáveis, de longo prazo.”

As principais instituições acadêmicas do mundo surfam a onda psicodélica com dedicação. Já o Brasil, que tem tradição pioneira de pesquisa com ayahuasca e figura entre os três países com estudos de maior impacto na área, atrás só de EUA e Reino Unido, está ficando para trás.

Por mais improvável que pareça durante um governo retrógrado como o de Jair Bolsonaro, a pergunta do primeiro post deste blog se mantém: quando o país vai abrir seu centro de pesquisa psicodélica? Onde estão os investidores brasileiros visionários o bastante para não se acomodar diante do obscurantismo?

Para quem quiser mais, em maio darei um curso sobre o renascimento psicodélico na plataforma Bora Saber:

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Psicodélicos enfrentam falso dilema farmacologia X autoconhecimento https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/03/28/psicodelicos-enfrentam-falso-dilema-farmacologia-x-autoconhecimento/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/03/28/psicodelicos-enfrentam-falso-dilema-farmacologia-x-autoconhecimento/#respond Sun, 28 Mar 2021 19:50:43 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/03/PORTAO2WikicommonsMarcinSzala-234x215.png https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=388 A popularidade acadêmica dos psicodélicos só faz crescer. O periódico JAMA Psychiatry, ao fazer um balanço dos 110 artigos de pesquisa que aceitou publicar entre os 2.190 recebidos em 2020, destacou um trabalho da Universidade Johns Hopkins (JHU) sobre psilocibina e depressão como um dos três textos mais lidos do ano.

Os outros dois versavam sobre saúde mental em tempos de Covid-19, um deles sobre suicídios. O artigo sobre psicodélicos não incluía a pandemia no título ou no resumo, largando mais atrás, portanto, na competição pelo interesse de especialistas.

Tamanho destaque só ressalta a visibilidade que o tema ganhou em anos recentes –aí incluído o cabo-de-guerra entre quem vê no renascimento psicodélico uma oportunidade bilionária para a indústria farmacêutica e os que nele enxergam a reversão da voga proibicionista que impediu, por quatro décadas, o acesso a fontes de bem-estar conhecidas há milênios.

A revista figura entre as de maior impacto no ramo da psiquiatria; os artigos que publica terminam citados em média por 17,5 outros estudos (dado de 2019). O estudo da JHU foi visto no ano passado por 118 mil interessados, e nestes primeiros meses de 2021 já somou mais 63 mil leitores, totalizando 181 mil. Em menos de cinco meses, já foi citado 11 vezes.

(Reprodução)

Toda essa atenção deriva de dois fatores. O primeiro está no fato de que grande parcela das pessoas que sofrem com transtornos mentais (depressão, estresse, ansiedade, dependência química etc.) não encontram alívio nas terapias farmacológicas disponíveis, como antidepressivos. Psiquiatras e pacientes precisam desesperadamente de alternativas.

O outro componente do interesse em alta decorre do enorme mercado que esses desassistidos representam. Já se estimou que possa ultrapassar US$ 400 bilhões anuais (R$ 2,3 trilhões).

Daí a corrida de pesquisadores e empresários investidores para serem os primeiros a ocupar espaço no novo território psicodélico. Seus veículos preferidos para conquistar o terreno sem dono são patentes e o reconhecimento por agências reguladoras, que abririam as portas para remuneração de tratamentos por planos de saúde privados ou públicos.

Nas duas últimas semanas, a controversa empresa britânica Compass Pathways obteve mais duas patentes nos Estados Unidos para sua versão sintética (COMP360) da psilocibina de cogumelos “mágicos” usada no tratamento de formas graves de depressão. A companhia já detinha uma patente, fonte do temor de que ela venha dificultar aplicações semelhantes do psicoativo dos fungos Psilocybe.

Psilocybe mexicana, cogumelo psicodélico (Creative Commons)

Essa forma de enquadrar o renascimento psicodélico se baseia no modelo da medicalização farmacológica dos distúrbios mentais. Todo e qualquer transtorno, visto dessa perspectiva, decorreria de falta ou excesso de substâncias no cérebro, como o neurotransmissor serotonina (não por acaso um dos mais afetados pelos psicodélicos clássicos como psilocibina, LSD, mescalina e DMT).

Tratar esses transtornos, então, seria questão apenas de interferir na bioquímica cerebral desbalanceada. Há defensores até de que se usem microdoses ou compostos sintéticos que atuem sobre os mesmos receptores neuronais mas não desencadeiem efeito psicodélico completo, pondo em dúvida o papel terapêutico de alucinações, distorções na percepção de tempo e espaço, experiências místicas e a chamada dissolução do ego.

Um representante destacado dessa corrente mais reducionista é David E. Olson, da Universidade da Califórnia em Davis. Ele fundou a empresa Delix Therapeutics, que tem por lema “Reconectar o Cérebro para Curar a Mente” e se propõe a “aplicar as ferramentas do desenvolvimento farmacêutico a algumas das terapias mais antigas da natureza, os psicodélicos”.

Olson assina o editorial de um número inteiramente dedicado a psicodélicos do periódico ACS Pharmacology & Translational Science, da Sociedade Americana de Química. O título é “A Promessa da Ciência Psicodélica”. A edição especial promete “expor a incrível gama de pesquisas sendo feitas para elucidar como os psicodélicos impactam a função cerebral –estudos que abrangem os níveis molecular, celular e organísmico”.

Há uma outra vertente de pesquisa que, mesmo não abrindo mão das ferramentas analíticas da biomedicina contemporânea, tampouco desdenha do saber acumulado por xamãs, psiconautas, terapeutas pré- ou pós-proibicionistas e condutores de testes clínicos de psicoterapia assistida por psicodélicos. Mais especificamente, gente que respeita a importância do set (disposição ou propósito mental) e do setting (situação em que se dá a viagem) para o eventual resultado terapêutico.

Não se trata de engolir uma pílula e esperar o resultado do feitiço bioquímico sobre os neurônios. Nos estudos experimentais mais próximos de obter aprovação de reguladores com a força da FDA (agência americana de fármacos), como no caso de MDMA para estresse pós-traumático, os participantes se submetem a várias sessões de terapia e só em algumas delas ingerem alguma droga enteogênica ou empatogênica.

Por trás da técnica está a noção de que a viagem empreendida sob efeito do composto psicoativo, algumas vezes de caráter místico, tem ela própria valor curativo. Além disso, esses candidatos a remédios –ainda são substâncias ilegais, cabe lembrar –ajudam a derrubar barreiras que impedem acesso a memórias e pensamentos, contribuindo para a psicoterapia propriamente dita nas sessões subsequentes de integração.

Ilustração de Speedy McVroom (Pixabay)

Numa palavra, em jogo está o autoconhecimento, não uma intervenção misteriosa operada pelas moléculas no tecido cerebral, à revelia da consciência. A própria tentativa em curso de capturar esse processo na moldura da prática clínica encontra seus críticos, que a classificam no mesmo processo de medicalização a fomentar a expectativa de curas milagrosas.

Tal é o alerta de Jonathan Dickinson e Dimitri Mugianis no artigo “Por que pesquisadores de saúde mental estudam psicodélicos de maneira inteiramente errada” na Salon: “O uso médico de drogas psicodélicas é retratado na mídia como uma bênção para profissionais de saúde mental, com relatos de resultados aparentemente miraculosos para tratar algumas das questões de saúde mental mais significativas que nossa época enfrenta”.

“Embora aplaudamos os esforços que estão em andamento para a descriminalização e estejamos entusiasmados com o potencial de aprendizado com a fortuna de praticantes tradicionais e clandestinos, muita coisa se perderá no processo de medicalização.” (Agradeço a Stevens Rehen pela indicação desse texto provocador.)

Com efeito, existe um tipo de purismo ou puritanismo farmacológico para o qual seria melhor livrar-se da bagagem contracultural, alternativa ou mística, das práticas subterrâneas e do que chamam pejorativamente de uso recreativo. Mas foi isso tudo que manteve os psicodélicos vivos mesmo sob o obscurantismo da Guerra às Drogas declarada pelo presidente Richard Nixon em 1971.

À luz dessa história, revela-se falso o dilema entre ciência contemporânea objetiva e técnicas de autoconhecimento há muito praticadas. O vigor do campo psicodélico vem do hibridismo, da fertilização cruzada entre as duas formas de investigação da psique (para escapar da dicotomia entre mente e cérebro) que sempre produziram frutos maravilhosos –e tanto mais quando caminham juntas, como pretendo defender neste curso:

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Corrida por patentes ameaça pesquisa com terapias psicodélicas https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/03/19/corrida-por-patentes-ameaca-pesquisa-com-terapias-psicodelicas/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/03/19/corrida-por-patentes-ameaca-pesquisa-com-terapias-psicodelicas/#respond Fri, 19 Mar 2021 14:03:38 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/03/Magic_mushroomsJanieWikiCommons-300x202.jpg https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=369 Um espectro ronda o renascimento psicodélico e ameaça a liberdade de pesquisa no campo das novas terapias para transtornos mentais como depressão. Bem no momento em que compostos como LSD, psilocibina e MDMA –substâncias ainda proibidas, bom lembrar– deixam a clandestinidade científica para retornar ao altar de templos da biomedicina acadêmica como Harvard, Johns Hopkins e Imperial College, reivindicações de propriedade intelectual podem barrar estudos clínicos já em andamento.

Após o presidente americano Richard Nixon declarar Guerra às Drogas em 1971, a pesquisa clínica com psicodélicos ficou abafada por três décadas, tornando-se uma linha de estudo suicida para a carreira de pesquisadores. Isso começou a mudar na passagem do século 20 para o 21, com a atenção renovada atraída por uma série cada vez mais encorpada de estudos clínicos.

A promessa de terapias inovadoras para distúrbios mentais fortaleceu-se a ponto de gerar um excesso de interesse da parte de investidores. Como resultado, a corrida para garantir direitos de patente sobre substâncias e práticas curativas muito antigas agora põe em risco a própria avalanche de estudos.

Veja o caso da psilocibina, ingrediente psicoativo dos “cogumelos mágicos” (principalmente as mais de 200 espécies do gênero Psilocybe). Vários deles são usados tradicionalmente em cerimônias por povos como os mazatecas do México, que revelaram o poder desses fungos para a ciência ocidental e nunca foram devidamente reconhecidos por isso.

De acordo com o diretório de patentes da área mantido pelo site Psilocybin alpha (uma fonte útil para análises do setor emergente de medicina psicodélica), existem 44 patentes concedidas ou sob análise tratando da psilocibina, 41 delas após o ano 2000; outras 24 foram solicitadas depois de 2019. Números similares abrangem pedidos de propriedade intelectual relativas a MDMA (53 patentes, 47 desde 2000) e DMT, psicodélico presente na ayahuasca (55, das quais 53 desde 2000).

A lógica por trás do privilégio de patente é remunerar o investimento realizado por inovadores, dando-lhes exclusividade sobre a invenção por 20 anos. O simples número de solicitações apresentadas, no entanto, assim como a abrangência do privilégio contido algumas delas, suscitaram muita preocupação nessa área.

A corrida pode ser comparada com uma onda de “cercamentos”, em que recém-chegados tentam garantir rapidamente um pedaço de chão tão grande quanto possível no terreno agora acessível. O movimento implica a exclusão daqueles que preservaram a área no passado, sejam eles xamãs experimentados no uso ou pesquisadores pioneiros e teimosos, que assumiram riscos quando quase ninguém ousava enfrentar a árdua viagem por território não cartografado.

Uma onda de “cercamentos”, em que recém-chegados tentam garantir rapidamente um pedaço de chão tão grande quanto possível

O primeiro alarme soou em 2018, após a empresa Compass Pathways, baseada no Reino Unido, solicitar três patentes para o uso de psilocibina para depressão resistente a outros tratamentos. Uma delas já foi concedida pelo Escritório de Patentes dos EUA (USPTO) em 31 de dezembro de 2019, deslanchando uma onda de protestos.

A reação partia do entendimento de que tal proteção poderia impedir o uso medicinal, recreativo ou ritual de cogumelos Psilocybe por terceiros. A preocupação arrefeceu desde então, à medida que se tornou mais claro que a patente cobre apenas uma forma cristalina específica de psilocibina sintética (COMP360), não o próprio fungo natural.

Apesar disso, prosseguiu acesa a apreensão quanto ao escopo amplo das patentes apresentadas pela Compass e seus impactos esperados sobre a pesquisa. Na realidade, ela entrou em combustão acelerada nas últimas semanas graças ao escritor, podcaster e investidor Tim Ferriss.

Numa série de tuítes, ele lançou o toque de reunir: “Estou muito preocupado com a grilagem patentária em preparação no mundo psicodélico do lucro (…) quando companhias tentam obter patentes amplas que poderiam impedir pesquisa científica, competição razoável (isto é, para obter escala e acesso amplo, precisamos de competição para reduzir custos)”.

Ferriss é muito influente nos círculos psicodélicos, como investidor visionário que despejou milhões de dólares e ajudou a levantar outro tanto para pôr de pé os pioneiros Centro para Pesquisa Psicodélica do Imperial College de Londres e Centro para Pesquisa Psicodélica e da Consciência. Também apoiou a Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos (Maps, em inglês).

Seria simplório acusá-lo de ser anticapitalista ou de ingenuamente colocar os interesses de xamãs à frente dos daqueles que sofrem com transtornos mentais debilitantes como depressão resistente ou estresse pós-traumático (TEPT) e poderiam beneficiar-se de eventuais medicamentos psicodélicos. Entretanto, essas acusações parecem insinuar-se nas entrelinhas da brusca refutação que partiu de Christian Angermayer, investidor que já financiou a Compass e fundou a empresa Atai Life Sciences, companhia alemã de biotecnologia interessada em psicodélicos.

Angermayer escreveu que Ferriss estaria “incrivelmente desorientado” nessa questão: “A Atai e a Compass (…) levantaram perto de US$ 650 milhões para essa causa só nos últimos anos, ao mesmo tempo em que trouxeram as melhores cabeças e inovação crítica para esse desafio. Se incluirmos capital levantado por outras empresas nesse campo, a soma vai para mais de US$ 1 bilhão”, argumentou o empresário. “Esse é nível de recursos, talento e compromisso necessário para finalmente mudar as coisas, e isso se torna possível por haver um modelo de negócios viável.”

“Se essas companhias forem bem-sucedidas, centenas de milhões de pessoas que sofrem atualmente poderão beneficiar-se, e, como essas drogas serão provavelmente aprovadas como drogas medicinais, há uma probabilidade significativa de que seguros de saúde as cubram”, escreveu Angermayer.

A troca de tuítes evoluiu para cartas abertas publicadas por Ferriss e Angermayer. A longa argumentação pode ser resumida assim:

1) De acordo com Ferriss, iniciativas em busca de lucro têm um papel crítico, mas não ganham por isso um passe livre, pois enfrentam incentivos para tomar decisões anti-éticas de maneira a gerar renda extra, tais como patentear “invenções” que não são invenções;

2) Angermayer alega que propriedade intelectual e dinheiro grosso são a chave para acelerar o acesso a novos remédios psicodélicos e compara o investimento requerido a uma hipoteca para adquirir uma casa que de outro modo não caberia no orçamento do cidadão mediano: “Por um certo período, a sociedade precisa pagar o financiamento (presumindo que a casa seja ótima e que a pessoa queira mudar-se para nela), mas depois disso a sociedade se torna proprietária e pode morar nela sem pagar aluguel”.

A argumentação de Angermayer se apoia sobre dois pilares. Primeiro, que a Compass não está patenteando um produto natural, e sim uma forma específica de psilocibina cristalizada (polimorfo A) produzida em grandes quantidades seguindo etapas de síntese otimizadas pela empresa. Depois, que a patente cobre o uso dessa inovação particular em terapia para depressão resistente a tratamento.

Os questionamentos às patentes da Compass se baseiam em vários argumentos: o polimorfo A quase certamente está presente tanto no produto natural quanto em outras formas do composto sintetizado; a Compass usa informações sobre a síntese publicadas anos atrás; o uso de psilocibina como adjuvante de psicoterapia para depressão já esteve em teste em vários ensaios clínicos, realizados, entre outros centros, pelo Imperial College e pela Johns Hopkins (para não falar de séculos ou milênios de uso medicinal).

Há preocupação geral com o risco de a incursão da Compass no domínio público psicodélico evolua para barreiras ao estudo clínico de fase 2 com psilocibina para depressão patrocinado pelo Instituto Usona. Afinal, o Usona é um competidor e obteve da FDA (agência americana de fármacos) o mesmo status de terapia revolucionária (breakthrough therapy) conferido à Compass.

Há risco de que a incursão da Compass no domínio público psicodélico  evolua para barreiras ao estudo clínico de fase 2 com psilocibina para depressão

A iniciativa da Usona, porém, se fundamenta numa abordagem oposta: o instituto publica todos os passos para a síntese de psilocibina, põe sua versão do composto à disposição de outros pesquisadores e não busca patentes para processos ou terapias relacionadas, contando em lugar disso com os cinco ou seis anos de direitos exclusivos que a aprovação pela FDA garante ao uso de dados do estudo clínico e à comercialização dos protocolos terapêuticos relacionados.

Cinco ou seis anos de direitos exclusivos, comparados com duas décadas de privilégio garantido por patentes, pode parecer pouco tempo para investidores em busca de enormes taxas de rendimento. Para muitos que não chegaram agora para o campo de batalha psicodélico, por outro lado, parecem ser uma maneira mais equitativa de tornar os novos medicamentos acessíveis a preços mais módicos

O argumento mais difícil de contrariar, contudo, é aquele dizendo que abrir mão de patentes não produzirá o montante de capital necessário –centenas de milhões de dólares, diz-se– para fazer um novo remédio chegar ao mercado. Sem essa montanha de dinheiro, pode-se atrasar desnecessariamente o acesso para quem precisa.

Não são só capitalistas gananciosos que adotam esse ponto de vista na matéria. Pesquisadores respeitados também, como David Nutt, do Imperial College, que me disse numa entrevista de 2019 serem as patentes um preço que teremos de pagar para ver psicodélicos regulamentados o mais cedo possível.

O mesmo se dá com David Nichols, professor emérito da Universidade Purdue e consultor da Compass listado como co-autor do pedido de patente. Nichols declarou a Ann Harrison, de Lucid News: “Há tamanha necessidade de novas terapias para tratar depressão e dependência química que me parece improvável uma estratégia sem fins lucrativos ser sustentável. Aplaudo os esforços do Instituto Usona para tornar essa medicação de uso global, mas pessoalmente não vejo como isso possa ser operado”.

Há que considerar, entretanto, o gigantesco mercado potencial para tratamento de transtornos mentais como depressão resistente, em especial após todo o sofrimento e isolamento impostos pela pandemia de Covid-19. Harrison relata em Lucid News que o mercado de todas as doenças que psicodélicos têm potencial para tratar está avaliado em US$ 400 bilhões anuais.

Em outras palavras, há muito dinheiro para ganhar com psicodélicos. Obviamente, essa é a razão que torna investidores tão ansiosos para garantir propriedade intelectual sobre essas aplicações.

Há muito dinheiro para ganhar com psicodélicos. Essa é a razão que torna investidores tão ansiosos para garantir propriedade intelectual

Se Nichols se alinha com a Compass, a estratégia do Usona obtém apoio de Rick Doblin, força motriz por trás da Maps, ONG que ele fundou 35 anos atrás. Nessa época, Ferriss e Angermayer ainda estavam no ensino fundamental.

É eloquente que a terapia psicodélica mais próxima de aprovação pela FDA –MDMA para estresse pós-traumático (TEPT)– decorra do trabalho desbravador realizado a muito custo por Doblin e seus colegas da Maps, e não por uma startup qualquer cheia de dinheiro depois de uma oferta pública de ações (IPO) bem-sucedida. O ensaio clínico multicêntrico de fase 3 em curso pela Maps sobre MDMA/TEPT deve publicar resultados promissores, neste ano ou no próximo, graças a financiamento obtido em anos e anos de campanhas.

Rick Doblin, fundador da Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos (Divulgação/Maps)

Não chega a ser surpresa que Doblin tenha apoiado Ferriss e questionado Angermayer numa série de tuítes. “Christian [Angermayer] não está certo quanto a patentes serem essenciais para obter direitos exclusivos para comercializar um medicamento”, escreveu.

“A exclusividade de dados difere de patentes pelo fato de não bloquear que outros patrocinadores gerem seu próprios dados para obter aprovação e comercializar o mesmo remédio para a mesma indicação ao mesmo tempo, se outros patrocinadores decidirem gastar tempo e dinheiro. Estamos muitos anos e US$ 50 milhões, por aí, à frente de quaisquer outros.”

Doblin foi mais longe: “Na medida em que a Atai e a Compass buscam lucro bloqueando os outros por meio de patentes sobre processos [de sínteses] ou processos terapêuticos que não inventaram, elas fracassarão e vão desperdiçar seu potencial para ser uma força em favor de curas e de lucros”.

Ativistas do campo psicodélico também protestaram contra essas pretensões. Bia Labate, diretora do Instituto Chacruna, assinala que “reivindicar ser preciso recorrer a técnicas agressivas de patenteamento a fim de tratar milhões de pessoas doentes em todo o globo seria como dizer que é preciso uma cadeia grande como a Starbucks para que as pessoas possam tomar café”.

Além de Angermayer, os avanços patentários da Compass também já haviam sido defendidos por Ekaterina Malievskaia, principal executiva médica da empresa e sua co-fundadora com o parceiro George Goldsmith, num artigo publicado pela Maps. Após narrar como a firma se distanciou de acordos anteriores de colaboração com os institutos Usona e Heffter, ela afirmou:

“Nossas patentes não impedem nenhum outro clínico de usar nosso produto ou quaisquer produtos contendo psilocibina em conjunção com os tipos de terapia ou apoio psicológico que julgarem útil, desde que não ameacem a segurança do paciente”, escreveu. “Por fim, nem nossas patentes nem estratégias regulatória e de preços têm impacto sobre as práticas da comunidade subterrânea de praticantes em situações não clínicas.”

Malievskaia e Angermayer não tiveram sucesso até aqui em convencer outros atores do campo psicodélico de que a Compass não pôs seus interesses comerciais e projeções de rentabilidade à frente de benefícios para a saúde pública e da liberdade de pesquisa. Uma das razões está em outra patente pedida pela empresa, WO2020212952.

Nesse pedido a Compass reclama propriedade intelectual sobre um método de tratar depressão descrito em 162 cláusulas. Elas incluem até a administração de psilocibina num recinto com aparência substancialmente não clínica, mobília aconchegante, decoração em cores suaves, um sistema de som de alta fidelidade e uma cama ou divã…

“Patentear métodos terapêuticos inventados por outros está fadado a fracassar, são terríveis para reputação e capitalismo fora-da-lei”

Qualquer pessoa familiarizada com protocolos de tratamentos psicodélicos desenvolvidos por legiões de terapeutas desde os anos 1960, alguns sob risco pessoal ao trabalhar sob o radar da lei em tempos de proibicionismo, pode reconhecer de imediato que não há novidade nenhuma aí. Fica visível uma intenção não muito sutil de impedir competição com a Compass. Doblin tuitou: “Tentativas de patentear métodos terapêuticos inventados por outros estão fadados a fracassar, são terríveis para a reputação e capitalismo fora-da-lei [capitalism gone rogue]”.

Tim Ferriss, ao que parece, estava certo quando redigiu diplomaticamente que “até as mais puras intenções podem ser distorcidas quando colidem com as duras realidades do negócio”.

Uma versão deste texto foi publicada em inglês no site do Instituto Chacruna

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Saiba quem é Rick Doblin, ex-hippie há 35 anos na vanguarda psicodélica https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/03/11/saiba-quem-e-rick-doblin-ex-hippie-ha-35-anos-vanguarda-da-ciencia-psicodelica/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/03/11/saiba-quem-e-rick-doblin-ex-hippie-ha-35-anos-vanguarda-da-ciencia-psicodelica/#respond Thu, 11 Mar 2021 16:32:47 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/03/Rick-Doblin-MAPS-300x169.png https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=361 Chovia a cântaros naquela noitinha de outubro de 2018 quando bati à casa de Rick Doblin em Belmont, subúrbio de Boston. Um dos principais responsáveis pelo que se convencionou chamar de renascimento psicodélico abriu a porta com o sorriso que lhe é peculiar e um celular na orelha, gesticulando para que o desconhecido encharcado entrasse.

Fomos direto para a mesa de fórmica na cozinha onde Rick trabalhava com um laptop e a tigela de pipoca à frente. O ex-hippie é uma usina multitarefa hiperativa, que parece dedicar cada minuto da vida à sua maior obra, a Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos (Maps, em inglês), que completa 35 anos de militância no mês que vem.

Foi preciso esperar uns 20 minutos até começar a entrevista para o livro “Psiconautas”, que sai agora em maio pela Editora Fósforo. Rick discutia com um aliado os próximos passos após o sucesso do debate sobre medicina psicodélica do dia anterior no Instituto Broad, iniciativa conjunta da Universidade Harvard e do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) consagrada à genômica. Falava também da bem-recebida palestra recente para uma reunião de chefes de polícia, na Flórida.

Graças em boa medida a sua persistência, substâncias psicodélicas como LSD, psilocibina, MDMA e DMT estão de volta ao panteão farmacológico da medicina, ainda que em fase experimental. Templos da biomedicina como o Imperial College de Londres, os hospitais Massachusetts General e Mount Sinai e as universidades de Nova York (NYU) e Johns Hopkins se apressam a abrir centros dedicados ao tema emergente de pesquisa clínica, seguindo a liderança da Maps.

Em 1986, contudo, era preciso muito tutano para criar uma ONG dessas apenas um ano depois de o governo americano proibir o MDMA. Primeira missão: processar a agência antidrogas DEA por isso. Era o auge da guerra às drogas deflagrada nos EUA pelo presidente Richard Nixon, que não via com bons olhos a crescente popularidade nas baladas de pílulas então conhecidas como ecstasy (hoje se fala mais MDMA, balinha, molly e até Michael Douglas).

Pílulas de ecstasy (MDMA) usadas em baladas (Divulgação/DEA)

O argumento de Rick era que não havia base científica para proscrever a droga empatógena –ao contrário– sob o pretexto de que não teria benefício para a saúde e carregaria potencial para criar dependência química. Mais de três décadas depois, ele caminha para vencer a disputa. Graças aos estudos patrocinados pela Maps, o MDMA é a substância psicodélica mais próxima de obter aprovação da FDA (agência americana de fármacos) para uso em tratamento psicoterápico para transtorno de estresse pós-traumático (TEPT).

Não deixa de ser ironia que um filho do movimento de objetores de consciência contra a Guerra do Vietnã, como Rick, se torne o campeão da luta por um remédio para aliviar o sofrimento psíquico de quase 900 mil veteranos de guerra americanos que padecem com TEPT. Não poucos desses ex-militares se tornam policiais e bombeiros, fechando a tríade de heróis que os conservadores dos EUA adoram cultuar.

Foi uma tacada de mestre da Maps e de Rick eleger esse transtorno e uma droga não alucinogênica para o teste clínico, alargando assim a trilha aberta pela descriminalização da maconha, que também começou pelo uso medicinal. Alguns estados americanos já começam a modificar suas leis e regulamentos para admitir o uso terapêutico de substâncias como psilocibina (psicoativo originalmente extraído dos cogumelos Psilocybe), com resultados promissores contra depressão e outros distúrbios mentais.

Psilocybe mexicana, cogumelo psicodélico (Creative Commons)

A Maps prepara agora a publicação dos resultados dos estudos clínicos de fase 3 realizados com MDMA para TEPT. Com isso, já tendo obtido acesso a uma via rápida de licenciamento na FDA como terapia revolucionária (breakthrough therapy), estima-se que o tratamento possa ser aprovado em 2022.

Não há dúvida de que Rick e a Maps têm mesmo muito o que comemorar.

 

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Brasil é 3º país com mais artigos de impacto sobre psicodélicos https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/02/09/brasil-e-3o-pais-com-mais-artigos-de-impacto-sobre-psicodelicos/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/02/09/brasil-e-3o-pais-com-mais-artigos-de-impacto-sobre-psicodelicos/#respond Tue, 09 Feb 2021 14:44:16 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/02/FernandaPalhanoFontesFotoDeAnastaciaVazUFRN-300x200.jpeg https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=311 Pesquisadores brasileiros e a ayahuasca ocupam posição invejável num campo de estudo em crescimento acelerado, o chamado renascimento psicodélico, que ganhou impulso após 2010. Segundo ranking publicado na última quarta-feira (3), o Brasil é o terceiro país que mais produz estudos de impacto, atrás somente dos EUA e do Reino Unido.

O levantamento de David Wyndham Lawrence saiu no Journal of Psychoactive Drugs. Ele montou duas listas de artigos sobre LSD, psilocibina (dos “cogumelos mágicos”), DMT (da ayahuasca), mescalina (do cacto peiote) e 5-MeO-DMT (do sapo-do-rio-colorado) –classificados como psicodélicos clássicos, que atuam sobre receptores do neurotransmissor serotonina.

A primeira lista traz os 50 trabalhos sobre o assunto que foram mais citados na literatura científica desde 1957, ano de um trabalho de Julius Axelrod sobre LSD que colecionou desde então 154 menções de outros especialistas. O campeão é Stephen Peroutka, com estudo de 1979 sobre LSD e receptores de serotonina detentor de 1.557 citações.

A segunda relação contém artigos com as maiores taxas anuais de citação, uma maneira de descontar a vantagem numérica conferida pela antiguidade. Nos dois casos, os rankings se limitam a 50 trabalhos cada um (77 ao todo, já que vários aparecem nas duas listas).

Lawrence dividiu os artigos em dois grupos temporais: uma primeira geração de 37 estudos em que predominavam investigações farmacológicas e observacionais, sobretudo sobre LSD; e a geração atual de trabalhos (40) com dominância de testes clínicos sobre efeitos terapêuticos em que se destaca a psilocibina. Após o primeiro pico de produção, 1965-75, a proibição de psicodélicos massacrou a pesquisa, que retornaria com força a partir de 2010.

(Reprodução/Journal of Psychoactive Drugs)

Na leva pioneira o Brasil nem aparece. Já na segunda figura em terceiro lugar com 5 artigos (12,5% do total), à frente da Suíça com 4 (10%). Em primeira colocação estão os EUA, com 15 (37,5%), seguido pelo Reino Unido, com 13 (32,5%). Ou seja, apenas quatro países reúnem 92,5% da produção científica mais relevante sobre psicodélicos.

Estudiosos brasileiros se destacam entre os artigos com maior taxa de citações, com Fernanda Palhano-Fontes na liderança. A engenheira de 35 anos especializada em imagens cerebrais atua no grupo do físico Dráulio de Araújo no Instituto do Cérebro e no Hospital Universitário Onofre Lopes, em Natal, ambos da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

Palhano-Fontes é a primeira autora de um artigo pioneiro sobre tratamento de depressão resistente com ayahuasca noticiado em 2018 na Folha. O texto aparece em sexto lugar no ranking daqueles com maior média anual de citações, 38/ano; os cinco que o precedem marcam de 38,6 a 50,2 citações/ano.

Há bom motivo para um estudo de país relativamente periférico em pesquisa científica destacar-se assim: nunca antes um teste clínico randomizado duplo-cego controlado com placebo havia investigado o efeito terapêutico de um psicodélico (DMT) contra depressão.

Maceração do cipó-mariri, um dos ingredientes da infusão de ayahuasca (Marcelo Leite/Folhapress)

“Aparecer na 6ª posição desse ranking, ao lado de nomes tão importantes do campo da pesquisa psicodélicas, reafirma o valor do nosso trabalho, feito completamente no Brasil, e me estimula a continuar fazendo pesquisa de qualidade”, disse a pesquisadora da UFRN ao blog.

Palhano-Fontes se refere ao fato de dois dos quatro autores do levantamento no Journal of Psychoactive Drugs serem estrelas da neurociência psicodélica: Robin Carhart-Harris, do Imperial College de Londres, e Roland Griffiths, da Universidade Johns Hopkins (EUA). Não por acaso eles parecem com quatro artigos cada um no ranking.

“Entre os ensaios clínicos que aparecem mais bem citados, o nosso é o único em que a ayahuasca foi investigada”, destaca a neurocientista da UFRN. “Isso mostra o potencial que temos no Brasil, uma vez que essa substância faz parte da cultura brasileira e tem seu uso religioso regulamentado aqui.”

A engenheira aparece com dois trabalhos no levantamento, o segundo também sobre ayahuasca, de 2015. Os outros três autores brasileiros citados também publicaram estudos sobre ayahuasca: Flávia Osório, Rafael Sanches e Rafael dos Santos, todos do grupo da USP de Ribeirão Preto liderado por Jaime Hallak, pioneiro na investigação de efeitos antidepressivos da ayahuasca e co-autor dos estudos na UFRN com Araújo, que trabalhou com Hallak na USP.

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Mass General e Mount Sinai entram na onda de centros psicodélicos https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/02/01/mass-general-e-mount-sinai-entram-na-onda-de-centros-psicodelicos/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/02/01/mass-general-e-mount-sinai-entram-na-onda-de-centros-psicodelicos/#respond Mon, 01 Feb 2021 14:20:54 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/02/MOUTASINAIreutersMikeSegar-300x199.jpg https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=296 A cada semana chegam dezenas de informes de investidores, notícias, avisos de transmissões ao vivo e lançamentos de livros sobre o renascimento psicodélico para a psiquiatria. Eis aqui algumas novidades selecionadas nos últimos dias, com destaque para dois templos da medicina dos EUA: Mass General e Mount Sinai.

O Hospital Geral de Massachusetts, mais conhecido como Mass General ou MGH, é o mais importante hospital ligado à Escola Médica da Universidade Harvard. Seu departamento de psiquiatria recebeu uma doação do Fundo em Memória de Arielle Soussan para Pesquisa Psicodélica que deu origem no MGH ao Centro para Neurociência de Psicodélicos, no final de 2020.

Arielle faleceu aos 24 anos, após anos sofrendo de depressão resistente às terapias disponíveis. Antes de morrer, interessou-se pelo estudo de substância psicoativas como psilocibina, DMT e LSD para tratar transtornos mentais, o que motivou a família a criar o fundo.

Metade dos gastos anuais com tratamentos para depressão nos EUA –US$ 350 bilhões (R$ 1,9 trilhão, o equivalente a ¼ do PIB brasileiro)– se destina a esses doentes que não encontram alívio nos medicamentos atuais. Esses pacientes apresentam baixa neuroplasticidade, ou seja, formam poucas conexões cerebrais novas e neurônios para abrir rotas alternativas à ruminação que caracteriza o transtorno, o que psicodélicos parecem capazes de estimular.

O novo centro do MGH, que agora se associa à Atai Life Sciences, uma startup alemã da área, focalizará suas pesquisas na neuroplasticidade. O psiquiatra Jerrold Rosenbaum, diretor do grupo, diz que, como a maioria dos médicos, via os psicodélicos apenas como drogas proibidas, de uso recreativo: “Quando comecei a aprender mais, percebi que havia aí uma oportunidade [de pesquisa] que deixamos passar subdesenvolvidas por décadas”, afirmou ao jornal Boston Globe.

Outra instituição a surfar o tsunami é a Escola de Medicina Icahn do sistema Mount Sinai, em Nova York, que emprega 7.200 médicos em oito hospitais. A faculdade, uma das 20 melhores dos EUA, abriu o Centro para Psicoterapia Psicodélica e Pesquisa de Trauma, que se dedicará a novos tratamentos para transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), depressão e ansiedade em veteranos militares e em civis.

O centro nova-iorquino terá na direção da psiquiatra Rachel Yehuda, uma especialista em TEPT que também dirige um centro de saúde mental para veteranos no Bronx. Ela própria treinada nos protocolos para uso de MDMA (ecstasy) desenvolvidos pela Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos (Maps), ONG à frente do teste clínico de fase 3 que deve levar em breve à aprovação do emprego psicoterápico da droga, diz ser importante conhecer as experiências subjetivas de quem sofre:

“As pessoas que tomam MDMA relatam sentimentos de introspecção, conexão, compaixão consigo mesmas e com os outros, empatia e confiança interpessoal aumentada, que são condições ótimas para se engajar no processamento de material [psíquico] difícil ou traumático”, afirmou à newsletter Psilocybin alpha. Ouça Yehuda falar de psicodélicos e do centro, em inglês, aqui.

MGH e Mount Sinai se somam, assim, a várias instituições de excelência acadêmica que abriram centros para pesquisa psicodélica, como Imperial College de Londres, Universidade Johns Hopkins e Universidade de Nova York. É uma onda irresistível. No Brasil há grupos com pesquisa de primeira linha no tema, mas instituições acadêmicas acossadas por um governo retrógrado se preparam mais uma vez para perder o bonde, como alertou o primeiro post neste blog.

Publicações científicas e não especializadas não cessam de editar reportagens especiais e notícias sobre o assunto. Na semana que passou foi a vez da Nature, que fez um apanhado das novidades do setor sob o título “Como ecstasy e psilocibina estão sacudindo a psiquiatria”.

O texto assinado por Paul Tullis trata dos testes clínicos com essas drogas –17 só em 2020– e do desafio posto para órgãos reguladores, que cedo ou tarde terão de retirar os psicodélicos da lista de substâncias banidas. Ao contrário do que supõem o senso comum e os conservadores proibicionistas, a ciência vem mostrado que elas podem ser usadas de maneira segura, têm benefícios médicos e não causam dependência –vale dizer, não faz sentido manter sua proscrição.

Testes clínicos com psicodélicos (Reprodução/Nature)

Dos 17 ensaios clínicos relacionados pela Nature, 13 investigam a psilocibina dos cogumelos ditos “mágicos”, do gênero Psilocybe. Esses fungos alucinógenos têm longa história na ciência psicodélica e seu uso terapêutico começa a ser legalizado nos EUA, na esteira da maconha medicinal, avanço cultural que nem mesmo o governo primitivo de Donald Trump conseguiu barrar.

Outra droga que deverá ganhar atenção nos EUA é a ibogaína, por seu potencial para ajudar a domar a epidemia de mortes de dependentes de opioides, que poderá chegar a 100 mil vítimas em 2021. Originária do ritual Bwiti no Gabão e outros países da África, a substância já é usada em poucos centros da Costa Rica e do Brasil, por exemplo, que conseguem autorizações excepcionais para administrar o alucinógeno a drogadictos e o fazem sob controle de médicos, uma vez que pode desencadear arritmias cardíacas.

Um indício forte de que arrefece o preconceito contra psicodélicos como a ibogaína está no interesse que despertam entre investidores e, por extensão, nas publicações dirigidas a homens de negócio, como a agência Bloomberg. A droga é tratada de forma respeitosa em vídeo recente de sua série Moonshot, que já tinha 27 mil visualizações na segunda-feira (1º/2).

Um dos espectadores, identificado como CryptoMilitary Vet, comentou: “Psicodélicos me curaram de todas as minhas dependências, TEPT, e me mostraram que esta é a minha realidade e que a controlo por escolha. O passado só dói se eu permitir, mas eu sei que ele não existe mais, e assim me curei”.

A ciência brasileira tem a sorte de contar não só com grupos de pesquisa experimentados na pesquisa de psicodélicos –na UFRN, na UFRJ, na USP e na Unicamp, por exemplo—mas também com uma origem nos estudos sobre ayahuasca (DMT), de uso religioso autorizado. Os rituais tradicionais oferecem uma moldura de segurança para o consumo dessa droga poderosa, o setting acolhedor que as psicoterapias em teste se empenham em reproduzir com a decoração de ambientes e música suave.

Essa linhagem garante que pesquisadores como Sidarta Ribeiro (Instituto do Cérebro da UFRN) e Stevens Rehen (UFRJ/IDOR) cultivem o respeito por tradições xamânicas. Eles combatem a noção de que bastam as moléculas para obter efeito terapêutico, visão farmacológica reducionista compartilhada entre alguns pesquisadores.

“O trabalho mais difícil é o de encontrar com a dor do outro”, disse Sidarta quinta-feira (28/1) numa transmissão ao vivo do Instituto Phaneros com Stevens. “Quem sabe de settings não são os psiquiatras, mas sim os xamãs, que estão fazendo psicoterapia psicodélica há muito tempo. Precisamos ter delicadeza e cuidado com a experiência das pessoas. O ambiente hospitalar pode ser um problema.”

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Startup levanta R$ 123 mi para explorar veneno de sapo contra depressão https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/01/14/startup-levanta-r-123-mi-para-explorar-veneno-de-sapo-contra-depressao/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/01/14/startup-levanta-r-123-mi-para-explorar-veneno-de-sapo-contra-depressao/#respond Thu, 14 Jan 2021 10:05:29 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/01/Bufo-alvarius-CC-HolgerKrisp-300x208.jpg https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=250 Numa segunda rodada com investidores, a startup Beckley PsyTech obteve £ 14 milhões (R$ 101 milhões) para realizar testes clínicos com a substância psicodélica 5-metoxi-DMT (5-MeO-DMT). O recurso se soma a £ 3 milhões (R$ 22 milhões) angariados em junho pela empresa do Reino Unido, surgida há cinco anos com pedigree dourado.

À frente da companhia de olho no veneno de sapo, como é conhecida a 5-MeO-DMT, está Cosmo Feilding Mellen, 35. Apesar da pouca idade, o rapaz tem larga experiência com psicodélicos –drogas que, como ele próprio diz, são usadas algumas há milhares de anos, ainda que seu plano de negócios não preveja compensações para povos tradicionais que as legaram para a ciência contemporânea.

A 5-MeO-DMT está presente na secreção das glândulas do sapo-do-rio-colorado, Bufo alvarius ou Incilius alvarius. Aspirar o vapor da droga, que é ilegal na maioria dos países, produz uma curta e radical viagem, muitas vezes descrita como uma sensação de morte. Após a experiência com 5-MeO-DMT, decaem indicadores de depressão, ansiedade e estresse, resultado que se mantém quatro semanas depois, de acordo com estudo recente.

Cosmo é filho de Amanda Feilding, criadora da Beckley Foundation, uma espécie de ONG que há 22 anos incentiva e financia projetos de ciência psicodélica e de reforma de políticas públicas sobre drogas. A condessa aparece como coautora de vários estudos que patrocinou no chamado renascimento psicodélico, mas agora decidiu que precisa de lucros para a empreitada de transformar esses compostos em remédios convencionais licenciados.

Cosmo Feildiong Mellen e Amanda Feilding, nos jardins de Beckley Park, nos arredores de Oxford, Reino Unido (Divulgação Beckley PsyTech)

“Minha mãe criou a Beckley Foundation em 1998. Sempre estive pesadamente envolvido com o tema da ciência psicodélica, cercado por esse tema, essa paixão”, conta Cosmo. “Tive a felicidade de crescer na companhia de figuras como Sasha Shulgin e Rick Doblin. Fui voluntário em vários testes no Imperial College, por exemplo para tomada de imagens do cérebro sob psilocibina.”

Alexander “Sasha” Shulgin é figura lendária no panteão psicodélico. Autor de livros como “Pihkal – Uma história de amor químico” e “Tihkal – A Continuação”, ambos com a mulher Ann, Shulgin sintetizou e experimentou com amigos dezenas de compostos psicodélicos, tema das duas obras. O farmacologista, apontado como redescobridor do ecstasy (MDMA), morreu em 2014.

Rick Doblin está à frente da iniciativa mais avançada para sacramentar um psicodélico como medicamento, o próprio MDMA de Shulgin. O ex-hippie e objetor de consciência que temia ser convocado para a guerra do Vietnã escolheu para o teste de fogo um composto que não engendra visões (razão pela qual o ecstasy não é considerado um psicodélico clássico) e uma condição típica de veteranos militares, o transtorno de estresse pós-traumático, numa estratégia esperta para vencer as resistências a psicodélicos.

Cinco anos atrás, com o crescimento do interesse de investidores na indústria de cânabis medicinal e psicodélicos, Amanda e Cosmo se lançaram a criar um braço da Beckley com fins lucrativos para continuar o trabalho da família, a fim de aumentar a escala e a ambição do que Amanda tentava fazer há cinco décadas.

“Basicamente, [queremos] aproveitar a oportunidade de nos tornarmos um farol, uma empresa ética fazendo coisas realmente boas”, afirma o CEO da PsyTech. “O objetivo é desenvolver psicodélicos como uma nova classe de medicamentos neuropsiquiátricos e tratar dessa necessidade de saúde [transtornos mentais como depressão] que rapidamente está se tornando o maior peso sobre o mundo.”

Mãe e filho não brincam em serviço. Buscaram na Johnson & Johnson duas pessoas experimentadas no desenvolvimento e autorização de fármacos: Steve Wooding (diretor científico da nova companhia) e Fiona Dunbar (assessora-chefe de medicina).

Como consultores, Cosmo e Amanda alistaram duas celebridades da nova neurociência: Robin Carhart-Harris, do Imperial College, e Matt Johnson, da Universidade Johns Hopkins. Não por acaso, as duas instituições acadêmicas foram pioneiras na abertura de centros de pesquisa psicodélica, elas mesmas envolvidas em ensaios clínicos com a psilocibina dos “cogumelos mágicos” para tratar vários transtornos mentais.

Segundo Cosmo, esse time analisou várias possibilidades de inovação, diante do que outros grupos estão investigando, e se fixou na 5-MeO-DMT como candidata a antidepressivo. A principal vantagem do composto batráquio é induzir uma alteração da consciência que dura uma hora ou menos, o que diminuiria de modo acentuado os custos da psicoterapia assistida por psicodélicos como LSD e psilocibina, que na configuração atual exigem acompanhamento de uma dupla de terapeutas por longos períodos.

“Dois terapeutas sentados com o paciente por 6-8 horas é uma alocação de recursos enorme para o paciente, vai ser difícil de disseminar e sairá caro, também”, pondera Cosmo. “O que sabemos sobre 5-MeO-DMT é que induz confiavelmente o tipo de experiência de dissolução do ego sabidamente correlacionada com resultados positivos de tratamento, mas com duração do efeito da droga abaixo de uma hora.”

O CEO não cogita patentear 5-MeO-DMT. A propriedade intelectual faz parte de seu modelo de negócios, mas essas drogas são substâncias conhecidas, algumas usadas há milhares de anos e sobre as quais muitas pessoas já escreveram –não são patenteáveis.

“Não é o mesmo que um desenvolvimento farmacêutico clássico. Haverá propriedade intelectual na criação de novos e inventivos passos de tratamento médico, na formulação, na aplicação, no modelo terapêutico.”

Cosmo não prevê, entretanto, compensação para povos tradicionais que preservaram o conhecimento sobre essas substâncias, uma das preocupações entre estudiosos do fenômeno cultural psicodélico. A PsyTech dedica uma parte da receita para a parceira estratégica Beckley Foundation, que não tem fins lucrativos: “Eles estão envolvidos em muitas atividades filantrópicas, de pesquisa a políticas públicas. É aí que focalizamos nossa responsabilidade social”, justifica.

O sigilo comercial impede no momento divulgar quais equipes conduzirão os testes clínicos de fase 1 e 2 (segurança, dosagem e evidência inicial de eficácia) com o veneno de sapo. A empresa só confirma que os ensaios serão realizados no Reino Unido tanto por parceiros acadêmicos quanto empresariais.

A Beckley Foundation lista pesquisadores brasileiros entre seus colaboradores, como os que atuam no Instituto do Cérebro da UFRN, no Institudo D’Or de Pesquisa e Ensino (Idor), na UFRJ e na Unicamp. Cosmo, que também tem alguma ligação com o Brasil –foi o diretor da versão para língua inglesa do documentário de Fernando Grostein Andrade “Quebrando o Tabu” (2012), sobre política de drogas– diz que a empresa Beckley PsyTech não tem planos concretos de parcerias por aqui.

Cosmo Feilding-Mellen, CEO da empresa Beckley PsyTech (Divulgação Beckley PsyTech)

Além do veneno de sapo, a empresa investe num programa de desenvolvimento de fármacos, novas entidades químicas baseadas no que se sabe sobre os psicodélicos existentes. A proposta é alterar as moléculas de maneira a melhorar os resultados clínicos ou a segurança.

Pergunto se a ideia seria retirar delas o efeito psicodélico propriamente dito, o que se chama de dissolução do ego ou experiência mística. Cosmo: “Não. Certamente não apenas nessa direção, de todo modo. Eu acredito que a experiência subjetiva é uma parte importante da eficácia do tratamento. Mas será interessante ver o que virá da ciência, de outras escolas de pensamento”.

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