Virada Psicodélica https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br Novidades da fronteira da pesquisa em saúde mental Wed, 01 Dec 2021 01:26:07 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Estudo testa cogumelos ‘mágicos’ contra desespero na linha de frente da Covid https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/06/13/estudo-testa-cogumelos-magicos-contra-desespero-na-linha-de-frente-da-covid/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/06/13/estudo-testa-cogumelos-magicos-contra-desespero-na-linha-de-frente-da-covid/#respond Mon, 14 Jun 2021 00:10:38 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/06/PedroLadeiraFolhapress-300x200.jpeg https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=518  

Parece impossível, nesta altura da pandemia, que o flagelo da Covid não resulte em danos sérios para a saúde mental. Luto, polarização, isolamento, perda de renda e de perspectivas, sequelas da infecção, proliferação de falsidades, aumento da desigualdade, regressão política –parece uma conspiração contra o equilíbrio emocional e a favor do desespero.

Nem tudo caminha para o fundo do poço, entretanto. Há um renascimento psicodélico em curso, e pesquisadores já se movimentam para buscar na revalorização dessas drogas um lenitivo para as primeiras vítimas da invasão dos coronavírus, os profissionais que atuam na linha de frente para salvar vidas.

Os sinais de deterioração na esfera psíquica estão à vista de todos. Nos Estados Unidos, por exemplo, em maio de 2020 –meros três meses após a chegada da Covid– ocorreram 42% mais mortes por overdose de opioides do que no mesmo mês do ano anterior. Teme-se que haja ainda uma alta de suicídios.

Uma revisão sistemática de 29 estudos sobre estado psicológico de profissionais de saúde atuando contra Covid concluiu que um quarto do pessoal nas enfermarias e UTIs sofre com depressão (24,3%) ou ansiedade (25,8%).

Noutro levantamento com 21 mil trabalhadores em 42 estabelecimentos do setor nos EUA, 61% relataram medo permanente de infectar-se e transmitir o vírus Sars-CoV-2, 43% se queixaram de sobrecarga de trabalho e 38% admitiram ansiedade ou depressão. Mais afetadas são as mulheres latinas ou negras.

Com a proliferação de bons resultados preliminares em testes de psilocibina (composto psicoativo dos chamados “cogumelos mágicos” do gênero Psilocybe) contra depressão, a Universidade de Washington e a empresa Cybin se uniram para lançar um ensaio clínico precisamente para sondar a possibilidade de que esse psicodélico clássico venha a aliviar o sofrimento de enfermeiras(os), assistentes e médicas(os) que trabalham diretamente com pacientes de Covid.

O teste clínico controlado duplo-cego será coordenado por Anthony Black em Seattle, noticiou o site da Forbes, uma cidade gravemente atingida pela pandemia. Como de hábito nesses estudos com psicodélicos para transtornos mentais, não será investigada só a droga, mas seu emprego como facilitadora de processos psicoterapêuticos, envolvendo várias sessões antes e depois da ingestão da droga.

O ensaio de Seattle se somará a outros 70 testes clínicos com psicodélicos identificados por pesquisadores do Canadá. A maioria tem por objeto MDMA (46%) –droga mais perto de ser aprovada para uso corrente, notadamente para tratar estresse pós-traumático– e psilocibina (41%), neste caso em geral contra depressão e ansiedade.

Só 21 desses estudos “renascentistas” tiveram resultados publicados, o que equivale a dizer que nada menos que meia centena de ensaios registrados estão em andamento ou para começar. Entre eles há dois testes clínicos em preparação no Brasil, na USP, com o psicodélico ibogaína para tratamento de dependência química (crack/cocaína e álcool).

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Investidor agressivo combate danos cerebrais com golpes de psicodélicos https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/05/31/investidor-agressivo-combate-danos-cerebrais-com-golpes-de-psicodelicos/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/05/31/investidor-agressivo-combate-danos-cerebrais-com-golpes-de-psicodelicos/#respond Mon, 31 May 2021 13:26:31 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/05/TysonMushroomsCortada-246x215.png https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=502 A disputa na arena empresarial dos psicodélicos anda acirrada. Quase todo dia competidores anunciam novas aquisições e investimentos, e a Wesana Health –criada há pouco mais de um mês– tem chamado atenção pela chegada de dois pesos pesados ao time.

Para traçar a estratégia de luta, entra em ação o experiente James Fadiman, autor do clássico psiconáutico “O Guia do Explorador Psicodélico – Jornadas Seguras, Terapêuticas e Sagradas” (aqui, em inglês; há também edição em espanhol, aqui). Na quinta-feira (27) a empresa noticiou que ele integrará seu comitê consultivo científico.

Fadiman faz estudos sobre psicodélicos desde os anos 1960, quando drogas como LSD, MDMA e psilocibina não eram proibidas (isso ocorreria nos anos 1970-80). O pesquisador e escritor defende que sejam usadas para fins espirituais (altas doses), propósitos terapêuticos (doses moderadas) e solução de problemas (microdoses). É muito lido no Vale do Silício e em Wall Street.

A Wesana tem como fundador e principal executivo Daniel Carcillo, um jogador de hóquei campeão pelos Chicago Blackhawks. Após 12 anos de carreira profissional e muitas pancadas na cabeça, foi diagnosticado aos 30 anos, em 2015, com síndrome pós-concussional.

Em sua página o ex-atleta Carcillo arrola uma lista chocante de sintomas: sensibilidade à luz; fala arrastada; problemas de memória, concentração e controle de impulsos; dores e pressão interna na cabeça; insônia; perda de apetite; confusão mental; ansiedade; depressão. Chegou a entreter pensamentos suicidas.

Essa modalidade de dano cerebral traumático aparece muito em boxeadores e jogadores de futebol americano, também. Depois de peregrinar por vários especialistas, Carcillo voltou-se a tratamentos inovadores e fundou a Wesana para fomentar pesquisas de terapias alternativas contra o mal que o aflige –entre elas a psilocibina, substância psicoativa dos cogumelos ditos “mágicos” (do gênero Psilocybe).

(Foto: Reprodução danielcarcillo.com)

Sua empresa saltou às manchetes na semana passada porque o lutador Mike Tyson não só investiu na Wesana, listada na Bolsa canadense, como fez a ponte entre ela e o Conselho Mundial de Boxe (WBC, em inglês). A entidade vai partilhar com a companhia seu acervo sobre danos cerebrais reunido desde a década de 1970.

O lutador, também diagnosticado com a condição cerebral, já tinha aparecido no noticiário após hilariante cena de talkshow em que Tyson engoliu 4g de cogumelos Psilocybe secos. A repercussão foi imediata, porém restrita mais à cena psicodélica, e lhe garantiu presença no 56º lugar de uma controversa lista das cem pessoas mais influentes da área.

Desta vez, teve sucesso instantâneo na imprensa esportiva a afirmação de Tyson de que os psicodélicos salvaram sua vida: “Todos achavam que eu estava louco, mordi a orelha de um cara”, disse à Reuters, referindo-se à luta com Evander Holyfield em 1997. “Fiz todas aquelas coisas, e assim que me apresentaram os cogumelos… minha vida inteira mudou.”

Nos planos de Carcillo está aprofundar o conhecimento sobre a síndrome e recrutar boxeadores como voluntários para o teste clínico de sua formulação de psilocibina em desenvolvimento, Sana0013. Para isso, fez duas outras contratações arrojadas, garantindo os passes de Mark Wingertzahn, que já atuou nos times das farmacêuticas GSK e Pfizer, e do médico Stephan Bart, craque com mais de 400 ensaios clínicos.

A Wesana por ora não enfrenta concorrência direta de outros testes clínicos já em andamento com psilocibina, porque esses têm por alvo a depressão. Vai precisar de toda a força de Tyson e toda a ginga de Muhammad Ali, contudo, para escapar dos avanços da britânica Compass Pathways, se esta desafiar a Sana0013 com as três patentes já obtidas para sua fórmula de psilocibina COMP360.

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Corrida por patentes ameaça pesquisa com terapias psicodélicas https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/03/19/corrida-por-patentes-ameaca-pesquisa-com-terapias-psicodelicas/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/03/19/corrida-por-patentes-ameaca-pesquisa-com-terapias-psicodelicas/#respond Fri, 19 Mar 2021 14:03:38 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/03/Magic_mushroomsJanieWikiCommons-300x202.jpg https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=369 Um espectro ronda o renascimento psicodélico e ameaça a liberdade de pesquisa no campo das novas terapias para transtornos mentais como depressão. Bem no momento em que compostos como LSD, psilocibina e MDMA –substâncias ainda proibidas, bom lembrar– deixam a clandestinidade científica para retornar ao altar de templos da biomedicina acadêmica como Harvard, Johns Hopkins e Imperial College, reivindicações de propriedade intelectual podem barrar estudos clínicos já em andamento.

Após o presidente americano Richard Nixon declarar Guerra às Drogas em 1971, a pesquisa clínica com psicodélicos ficou abafada por três décadas, tornando-se uma linha de estudo suicida para a carreira de pesquisadores. Isso começou a mudar na passagem do século 20 para o 21, com a atenção renovada atraída por uma série cada vez mais encorpada de estudos clínicos.

A promessa de terapias inovadoras para distúrbios mentais fortaleceu-se a ponto de gerar um excesso de interesse da parte de investidores. Como resultado, a corrida para garantir direitos de patente sobre substâncias e práticas curativas muito antigas agora põe em risco a própria avalanche de estudos.

Veja o caso da psilocibina, ingrediente psicoativo dos “cogumelos mágicos” (principalmente as mais de 200 espécies do gênero Psilocybe). Vários deles são usados tradicionalmente em cerimônias por povos como os mazatecas do México, que revelaram o poder desses fungos para a ciência ocidental e nunca foram devidamente reconhecidos por isso.

De acordo com o diretório de patentes da área mantido pelo site Psilocybin alpha (uma fonte útil para análises do setor emergente de medicina psicodélica), existem 44 patentes concedidas ou sob análise tratando da psilocibina, 41 delas após o ano 2000; outras 24 foram solicitadas depois de 2019. Números similares abrangem pedidos de propriedade intelectual relativas a MDMA (53 patentes, 47 desde 2000) e DMT, psicodélico presente na ayahuasca (55, das quais 53 desde 2000).

A lógica por trás do privilégio de patente é remunerar o investimento realizado por inovadores, dando-lhes exclusividade sobre a invenção por 20 anos. O simples número de solicitações apresentadas, no entanto, assim como a abrangência do privilégio contido algumas delas, suscitaram muita preocupação nessa área.

A corrida pode ser comparada com uma onda de “cercamentos”, em que recém-chegados tentam garantir rapidamente um pedaço de chão tão grande quanto possível no terreno agora acessível. O movimento implica a exclusão daqueles que preservaram a área no passado, sejam eles xamãs experimentados no uso ou pesquisadores pioneiros e teimosos, que assumiram riscos quando quase ninguém ousava enfrentar a árdua viagem por território não cartografado.

Uma onda de “cercamentos”, em que recém-chegados tentam garantir rapidamente um pedaço de chão tão grande quanto possível

O primeiro alarme soou em 2018, após a empresa Compass Pathways, baseada no Reino Unido, solicitar três patentes para o uso de psilocibina para depressão resistente a outros tratamentos. Uma delas já foi concedida pelo Escritório de Patentes dos EUA (USPTO) em 31 de dezembro de 2019, deslanchando uma onda de protestos.

A reação partia do entendimento de que tal proteção poderia impedir o uso medicinal, recreativo ou ritual de cogumelos Psilocybe por terceiros. A preocupação arrefeceu desde então, à medida que se tornou mais claro que a patente cobre apenas uma forma cristalina específica de psilocibina sintética (COMP360), não o próprio fungo natural.

Apesar disso, prosseguiu acesa a apreensão quanto ao escopo amplo das patentes apresentadas pela Compass e seus impactos esperados sobre a pesquisa. Na realidade, ela entrou em combustão acelerada nas últimas semanas graças ao escritor, podcaster e investidor Tim Ferriss.

Numa série de tuítes, ele lançou o toque de reunir: “Estou muito preocupado com a grilagem patentária em preparação no mundo psicodélico do lucro (…) quando companhias tentam obter patentes amplas que poderiam impedir pesquisa científica, competição razoável (isto é, para obter escala e acesso amplo, precisamos de competição para reduzir custos)”.

Ferriss é muito influente nos círculos psicodélicos, como investidor visionário que despejou milhões de dólares e ajudou a levantar outro tanto para pôr de pé os pioneiros Centro para Pesquisa Psicodélica do Imperial College de Londres e Centro para Pesquisa Psicodélica e da Consciência. Também apoiou a Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos (Maps, em inglês).

Seria simplório acusá-lo de ser anticapitalista ou de ingenuamente colocar os interesses de xamãs à frente dos daqueles que sofrem com transtornos mentais debilitantes como depressão resistente ou estresse pós-traumático (TEPT) e poderiam beneficiar-se de eventuais medicamentos psicodélicos. Entretanto, essas acusações parecem insinuar-se nas entrelinhas da brusca refutação que partiu de Christian Angermayer, investidor que já financiou a Compass e fundou a empresa Atai Life Sciences, companhia alemã de biotecnologia interessada em psicodélicos.

Angermayer escreveu que Ferriss estaria “incrivelmente desorientado” nessa questão: “A Atai e a Compass (…) levantaram perto de US$ 650 milhões para essa causa só nos últimos anos, ao mesmo tempo em que trouxeram as melhores cabeças e inovação crítica para esse desafio. Se incluirmos capital levantado por outras empresas nesse campo, a soma vai para mais de US$ 1 bilhão”, argumentou o empresário. “Esse é nível de recursos, talento e compromisso necessário para finalmente mudar as coisas, e isso se torna possível por haver um modelo de negócios viável.”

“Se essas companhias forem bem-sucedidas, centenas de milhões de pessoas que sofrem atualmente poderão beneficiar-se, e, como essas drogas serão provavelmente aprovadas como drogas medicinais, há uma probabilidade significativa de que seguros de saúde as cubram”, escreveu Angermayer.

A troca de tuítes evoluiu para cartas abertas publicadas por Ferriss e Angermayer. A longa argumentação pode ser resumida assim:

1) De acordo com Ferriss, iniciativas em busca de lucro têm um papel crítico, mas não ganham por isso um passe livre, pois enfrentam incentivos para tomar decisões anti-éticas de maneira a gerar renda extra, tais como patentear “invenções” que não são invenções;

2) Angermayer alega que propriedade intelectual e dinheiro grosso são a chave para acelerar o acesso a novos remédios psicodélicos e compara o investimento requerido a uma hipoteca para adquirir uma casa que de outro modo não caberia no orçamento do cidadão mediano: “Por um certo período, a sociedade precisa pagar o financiamento (presumindo que a casa seja ótima e que a pessoa queira mudar-se para nela), mas depois disso a sociedade se torna proprietária e pode morar nela sem pagar aluguel”.

A argumentação de Angermayer se apoia sobre dois pilares. Primeiro, que a Compass não está patenteando um produto natural, e sim uma forma específica de psilocibina cristalizada (polimorfo A) produzida em grandes quantidades seguindo etapas de síntese otimizadas pela empresa. Depois, que a patente cobre o uso dessa inovação particular em terapia para depressão resistente a tratamento.

Os questionamentos às patentes da Compass se baseiam em vários argumentos: o polimorfo A quase certamente está presente tanto no produto natural quanto em outras formas do composto sintetizado; a Compass usa informações sobre a síntese publicadas anos atrás; o uso de psilocibina como adjuvante de psicoterapia para depressão já esteve em teste em vários ensaios clínicos, realizados, entre outros centros, pelo Imperial College e pela Johns Hopkins (para não falar de séculos ou milênios de uso medicinal).

Há preocupação geral com o risco de a incursão da Compass no domínio público psicodélico evolua para barreiras ao estudo clínico de fase 2 com psilocibina para depressão patrocinado pelo Instituto Usona. Afinal, o Usona é um competidor e obteve da FDA (agência americana de fármacos) o mesmo status de terapia revolucionária (breakthrough therapy) conferido à Compass.

Há risco de que a incursão da Compass no domínio público psicodélico  evolua para barreiras ao estudo clínico de fase 2 com psilocibina para depressão

A iniciativa da Usona, porém, se fundamenta numa abordagem oposta: o instituto publica todos os passos para a síntese de psilocibina, põe sua versão do composto à disposição de outros pesquisadores e não busca patentes para processos ou terapias relacionadas, contando em lugar disso com os cinco ou seis anos de direitos exclusivos que a aprovação pela FDA garante ao uso de dados do estudo clínico e à comercialização dos protocolos terapêuticos relacionados.

Cinco ou seis anos de direitos exclusivos, comparados com duas décadas de privilégio garantido por patentes, pode parecer pouco tempo para investidores em busca de enormes taxas de rendimento. Para muitos que não chegaram agora para o campo de batalha psicodélico, por outro lado, parecem ser uma maneira mais equitativa de tornar os novos medicamentos acessíveis a preços mais módicos

O argumento mais difícil de contrariar, contudo, é aquele dizendo que abrir mão de patentes não produzirá o montante de capital necessário –centenas de milhões de dólares, diz-se– para fazer um novo remédio chegar ao mercado. Sem essa montanha de dinheiro, pode-se atrasar desnecessariamente o acesso para quem precisa.

Não são só capitalistas gananciosos que adotam esse ponto de vista na matéria. Pesquisadores respeitados também, como David Nutt, do Imperial College, que me disse numa entrevista de 2019 serem as patentes um preço que teremos de pagar para ver psicodélicos regulamentados o mais cedo possível.

O mesmo se dá com David Nichols, professor emérito da Universidade Purdue e consultor da Compass listado como co-autor do pedido de patente. Nichols declarou a Ann Harrison, de Lucid News: “Há tamanha necessidade de novas terapias para tratar depressão e dependência química que me parece improvável uma estratégia sem fins lucrativos ser sustentável. Aplaudo os esforços do Instituto Usona para tornar essa medicação de uso global, mas pessoalmente não vejo como isso possa ser operado”.

Há que considerar, entretanto, o gigantesco mercado potencial para tratamento de transtornos mentais como depressão resistente, em especial após todo o sofrimento e isolamento impostos pela pandemia de Covid-19. Harrison relata em Lucid News que o mercado de todas as doenças que psicodélicos têm potencial para tratar está avaliado em US$ 400 bilhões anuais.

Em outras palavras, há muito dinheiro para ganhar com psicodélicos. Obviamente, essa é a razão que torna investidores tão ansiosos para garantir propriedade intelectual sobre essas aplicações.

Há muito dinheiro para ganhar com psicodélicos. Essa é a razão que torna investidores tão ansiosos para garantir propriedade intelectual

Se Nichols se alinha com a Compass, a estratégia do Usona obtém apoio de Rick Doblin, força motriz por trás da Maps, ONG que ele fundou 35 anos atrás. Nessa época, Ferriss e Angermayer ainda estavam no ensino fundamental.

É eloquente que a terapia psicodélica mais próxima de aprovação pela FDA –MDMA para estresse pós-traumático (TEPT)– decorra do trabalho desbravador realizado a muito custo por Doblin e seus colegas da Maps, e não por uma startup qualquer cheia de dinheiro depois de uma oferta pública de ações (IPO) bem-sucedida. O ensaio clínico multicêntrico de fase 3 em curso pela Maps sobre MDMA/TEPT deve publicar resultados promissores, neste ano ou no próximo, graças a financiamento obtido em anos e anos de campanhas.

Rick Doblin, fundador da Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos (Divulgação/Maps)

Não chega a ser surpresa que Doblin tenha apoiado Ferriss e questionado Angermayer numa série de tuítes. “Christian [Angermayer] não está certo quanto a patentes serem essenciais para obter direitos exclusivos para comercializar um medicamento”, escreveu.

“A exclusividade de dados difere de patentes pelo fato de não bloquear que outros patrocinadores gerem seu próprios dados para obter aprovação e comercializar o mesmo remédio para a mesma indicação ao mesmo tempo, se outros patrocinadores decidirem gastar tempo e dinheiro. Estamos muitos anos e US$ 50 milhões, por aí, à frente de quaisquer outros.”

Doblin foi mais longe: “Na medida em que a Atai e a Compass buscam lucro bloqueando os outros por meio de patentes sobre processos [de sínteses] ou processos terapêuticos que não inventaram, elas fracassarão e vão desperdiçar seu potencial para ser uma força em favor de curas e de lucros”.

Ativistas do campo psicodélico também protestaram contra essas pretensões. Bia Labate, diretora do Instituto Chacruna, assinala que “reivindicar ser preciso recorrer a técnicas agressivas de patenteamento a fim de tratar milhões de pessoas doentes em todo o globo seria como dizer que é preciso uma cadeia grande como a Starbucks para que as pessoas possam tomar café”.

Além de Angermayer, os avanços patentários da Compass também já haviam sido defendidos por Ekaterina Malievskaia, principal executiva médica da empresa e sua co-fundadora com o parceiro George Goldsmith, num artigo publicado pela Maps. Após narrar como a firma se distanciou de acordos anteriores de colaboração com os institutos Usona e Heffter, ela afirmou:

“Nossas patentes não impedem nenhum outro clínico de usar nosso produto ou quaisquer produtos contendo psilocibina em conjunção com os tipos de terapia ou apoio psicológico que julgarem útil, desde que não ameacem a segurança do paciente”, escreveu. “Por fim, nem nossas patentes nem estratégias regulatória e de preços têm impacto sobre as práticas da comunidade subterrânea de praticantes em situações não clínicas.”

Malievskaia e Angermayer não tiveram sucesso até aqui em convencer outros atores do campo psicodélico de que a Compass não pôs seus interesses comerciais e projeções de rentabilidade à frente de benefícios para a saúde pública e da liberdade de pesquisa. Uma das razões está em outra patente pedida pela empresa, WO2020212952.

Nesse pedido a Compass reclama propriedade intelectual sobre um método de tratar depressão descrito em 162 cláusulas. Elas incluem até a administração de psilocibina num recinto com aparência substancialmente não clínica, mobília aconchegante, decoração em cores suaves, um sistema de som de alta fidelidade e uma cama ou divã…

“Patentear métodos terapêuticos inventados por outros está fadado a fracassar, são terríveis para reputação e capitalismo fora-da-lei”

Qualquer pessoa familiarizada com protocolos de tratamentos psicodélicos desenvolvidos por legiões de terapeutas desde os anos 1960, alguns sob risco pessoal ao trabalhar sob o radar da lei em tempos de proibicionismo, pode reconhecer de imediato que não há novidade nenhuma aí. Fica visível uma intenção não muito sutil de impedir competição com a Compass. Doblin tuitou: “Tentativas de patentear métodos terapêuticos inventados por outros estão fadados a fracassar, são terríveis para a reputação e capitalismo fora-da-lei [capitalism gone rogue]”.

Tim Ferriss, ao que parece, estava certo quando redigiu diplomaticamente que “até as mais puras intenções podem ser distorcidas quando colidem com as duras realidades do negócio”.

Uma versão deste texto foi publicada em inglês no site do Instituto Chacruna

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Artigo pede retribuição a povo mazateca por revelar ‘espíritu’ de cogumelos https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/01/28/artigo-pede-retribuicao-a-povo-mazateca-por-revelar-espiritu-de-cogumelos/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/01/28/artigo-pede-retribuicao-a-povo-mazateca-por-revelar-espiritu-de-cogumelos/#respond Thu, 28 Jan 2021 20:04:28 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/01/HuautlaEfrenDelSosalCreativeCommons-300x200.jpg https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=279 Substâncias psicodélicas renascem para psiquiatria, com a psilocibina na vanguarda, maculadas por um pecado original: a ciência nunca saldou sua dívida histórica com o povo mazateca, do México. A cobrança aparece agora num artigo de pesquisadores liderados pelo brasileiro Eduardo Schenberg, do Instituto Phaneros (há um vídeo em que os autores explicam seu propósito, aqui).

O composto tem sua origem nos cogumelos do gênero Psilocybe, como o Psilocybe cubensis encontrado no Brasil ou o P. semilanceata na Europa. Até 1957, esses fungos costumavam ser classificados como tóxicos e perigosos. Suas virtudes curativas só foram reveladas para a ciência ocidental pelas práticas rituais dos mazatecas.

A revelação se deu naquele ano em uma reportagem do banqueiro e micologista amador R. Gordon Wasson na revista Life. Ele viajou a Huautla de Jimenez, estado de Oaxaca (México), e ali se iniciou nos ritos com Psilocybe mexicana guiado pela curandeira Maria Sabina, cuja identidade Wasson de início protegeu sob o pseudônimo Eva Mendez.

Psilocybe mexicana, cogumelo psicodélico (Creative Commons)

Poucos anos depois o princípio psicoativo psilocibina foi isolado, sintetizado e patenteado por Albert Hofmann –o criador do LSD– no laboratório suíço Sandoz, como narra o texto de Schenberg e colegas. A droga chegou a ser comercializada sob a marca Indocybin. O artigo não cita, mas cinco anos depois Wasson levou Hofmann a Huautla, onde o químico ouviu de Sabina que sua psilocibina sintética tinha “espíritu”.

Maria Sabina (Creative Commons)

O preferido das pesquisas psicodélicas nos anos 1960 era o LSD, não a psilocibina, que o guru lisérgico Timothy Leary chegou a usar e logo abandonou em favor do ácido. Não demorou para que o impulso libertário do LSD despertasse a reação conservadora, que levou a limitações crescentes que desembocariam na completa proibição do LSD.

Quando a ciência psicodélica viu iniciar-se o atual renascimento, a partir de 2000, ganhou projeção a psilocibina, menos estigmatizada. Há dezenas de estudos em andamento ou concluídos para investigar seu potencial como tratamento para depressão, ansiedade, estresse, anorexia, enxaqueca, dependência química, tabagismo, alcoolismo (cabe assinalar que se trata ainda de droga proibida no Brasil e outros países, embora os cogumelos em si sejam tolerados e venham sendo legalizados aqui e ali nos EUA).

Existem também dezenas de pedidos patentários relacionados com a droga, alguns em exame e outros já concedidos, como se vê numa listagem apresentada no artigo a partir do registro de patentes de psilocibina mantido pela newsletter Psilocybinalpha. Só a empresa Compass Pathways, cujo valor de mercado alcançou US$ 1,5 bilhão (cerca de R$ 8 bilhões) e que organiza um teste clínico controlado para tratar depressão, tem seis solicitações cobrindo sua formulação medicinal aperfeiçoada do composto.

Tudo indica que está em gestação um mercado bilionário para terapias psicodélicas. A questão levantada no artigo de Schenberg e colegas se centra na ausência de previsão para reconhecimento e retribuição a povos tradicionais pelo conhecimento que indicou as pistas até essas substâncias (como a ayahuasca de indígenas brasileiros e peruanos, outro exemplo).

Não é uma ligação tênue, diga-se. Os mazatecas faziam uso espiritual dos cogumelos mágicos, assim como acontece nas religiões da ayahuasca, e não faltam estudos relacionando diretamente o grau da resposta terapêutica à intensidade da viagem mística desencadeada pela psilocibina –embora se debata se o componente espiritual da experiência é necessário para dissolver a rigidez mental por trás desses transtornos.

A retribuição pelo uso de conhecimento tradicional está prevista em vários tratados internacionais, da Convenção da Biodiversidade (1992) aos protocolos de Cartagena (2000) e Nagoya (2010). No entanto, as boas intenções consagradas nessas normas raramente acabam postas em prática.

Pelo andar da carruagem dourada em que a ciência psicodélica ressurge na praça, a esta altura pode parecer ingênuo esperar que mazatecas recebam compensação digna da Compass pela tecnologia sábia de Maria Sabina e seus ancestrais. Nunca é demais lembrar, contudo, que esse ramo de pesquisa é caudatário de uma revolução libertária nos costumes e nos valores, a contracultura dos anos 1960/70, sem a qual o antirracismo e o decolonialismo jamais teriam chegado ao presente.

Pedaço de grafiti que sobreviveu a terremoto em Juchitán, Oaxaca (AFP/Pedro Pardo)

O Instituto Chacruna, sediado na Califórnia, promove há muito tempo discussões sobre apropriação cultural e reciprocidade com povos indígenas. Em 2017, o Instituto sediou a conferência Plantas Sagradas nas Américas, em Ajijc, no México, trazendo lideranças mazatecas para o circuito psicodélico contemporâneo.

A segunda edição está prevista para abril de 2021, quando será lançada a iniciativa Indigenous Reciprocity of the Americas, para estimular que usuários individuais de substâncias psicodélicas e novos empresários passem a considerar as raízes desse movimento e a exercer reciprocidade. “Infelizmente os ocidentais têm uma visão em geral reducionista desses temas”, lamenta Bia Labate, antropóloga brasileira que dirige o Chacruna.

“Da mesma forma que a esposa de Gordon Wasson, Valentina, foi excluída das principais narrativas do mainstream psicodélico, há pouco reconhecimento ao papel dos povos tradicionais na origem dos conhecimentos da ciência psicodélica. Também há uma tendência a um ‘mazatecocentrismo’, atribuindo a esse povo o conhecimento único e original com sobre cogumelos,  quando existem vários grupos que fazem uso dessas práticas.”

“Precisamos decolonizar nossa ciência. Mas reciprocidade não é apenas doar dinheiro, e sim aprender a escutar, mover-se lentamente, criar relações duradouras e projetos horizontais, em colaboração mútua. Às vezes, aceitar que populações indígenas podem não estar interessadas nessa relação.”

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Minidose de psilocibina promete reduzir frequência de enxaquecas https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/01/19/minidose-de-psilocibina-promete-reduzir-frequencia-de-enxaquecas/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/01/19/minidose-de-psilocibina-promete-reduzir-frequencia-de-enxaquecas/#respond Tue, 19 Jan 2021 20:44:10 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/01/EnxaquecaFabioHMendesFolhapress2015-300x200.jpg https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=263 Quando era criança, o terror da casa eram as enxaquecas de nossa mãe, Edith. Ela se trancava no quarto, com as janelas fechadas de dia, e ai de quem desse um pio no quintal –o mundo viria abaixo. E pensar que uns 10 miligramas de psilocibina agora prometem reduzir pesadelos como esse de mais de cinco décadas atrás…

A promessa aparece num estudo da Universidade Yale publicado no periódico Neurotherapeutics. Emmanuelle Schindler, Deepak D’Souza e colegas testaram a forma sintética da substância psicodélica originalmente obtida de cogumelos ditos “mágicos” (gênero Psilocybe) num grupo de apenas dez pessoas, mas com resultados animadores.

É o que se chama de prova de conceito, ou prova de princípio. Cada participante recebeu a dose baixa de psilocibina (cerca de 10 mg, dependendo do peso da pessoa, quando outros estudos psicodélicos recorrem a 25-30 mg) numa sessão e placebo na outra, separadas por duas semanas, sem saber o que tomava em cada uma.

Cogumelos da espécie Psilocybe cubensis, que contém a substância psicodélica psilocibina (Divulgação)

Os experimentadores também desconheciam quem ingeriu o quê no primeiro e no segundo encontro –é o que se chama de ensaio duplo-cego. Os pacientes mantiveram diários sobre seus ataques de dor de cabeça, começando duas semanas antes da sessão inicial e indo até duas semanas depois da última.

O efeito placebo induziu uma ligeira redução na frequência das enxaquecas (em média -0,15 dia/semana) nas duas semanas após a ingestão da pílula inócua. Depois da psilocibina, o resultado foi muito superior: -1,65 dia/semana de sofrimento, ou 1,5 dia em média de ganho. Edith teria adorado os cogumelos e decerto concordaria que são mesmo “mágicos”.

As enxaquecas, que costumam afetar 15% da população mundial, vêm somar-se a uma lista de testes com psicodélicos para tratar condições neurológicas e psiquiátricas que anda pela casa da dezena. A empresa MindMed, por exemplo, investe num ensaio clínico de fase 2 para verificar o potencial de LSD contra dores de cabeça em salvas (“cluster headaches”), que podem ocorrer mais de uma vez por dia, mas não são acompanhadas de sintomas de enxaqueca como náusea e fotofobia.

O transtorno mental mais estudado é a depressão, em especial a modalidade resistente aos medicamentos disponíveis, que acomete cerca de um terço ou mais dos deprimidos. Além dos estudos preliminares já concluídos, há pelo menos oito testes clínicos começando ou em andamento com psilocibina e outros compostos sintéticos.

Em seguida aparece a dependência química, sobretudo de opioides e álcool, investigados em seis ensaios, por exemplo com MDMA –a base do ecstasy, aliás, é o único composto psicoativo que chegou à fase 3, mas para tratar o transtorno de estresse pós-traumático.

Em seguida na lista surgem tipos de ansiedade, com quatro estudos envolvendo MDMA, LSD e psilocibina. O rol prossegue com anorexia, Alzheimer, autismo e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (um teste cada).

O serviço de informações Psilocybin alpha mantém um registro atualizado dos ensaios clínicos com psicodélicos, com links para seus registros oficiais e perfis das instituições envolvidas.

Vale a pena acompanhar, porque a coisa não para de crescer.

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Efeito emocional de cogumelo dura 7 dias; novas conexões mentais, 1 mês https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2020/10/28/efeito-emocional-de-cogumelo-dura-7-dias-novas-conexoes-mentais-1-mes/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2020/10/28/efeito-emocional-de-cogumelo-dura-7-dias-novas-conexoes-mentais-1-mes/#respond Wed, 28 Oct 2020 17:58:25 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2020/10/ConexoesCerebrais-300x135.png https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=56  

A substância psicoativa psilocibina, originária de cogumelos Psilocybe, tem demonstrado bom potencial antidepressivo. A origem desse efeito ainda é mal conhecida, mas estudo da Universidade Johns Hopkins (JHU), nos EUA, mostrou que emoções positivas perduram por uma semana e que 30 dias depois o padrão de conexões cerebrais ainda se mostrava enriquecido.

Passados 7 ou 30 dias, primeiro e segundo pontos de coleta de dados da pesquisa, já não há mais vestígios da psilocibina no corpo, pois o composto é metabolizado rapidamente. Uma viagem com cogumelos “mágicos” dura cerca de 6 horas.

O fato de alterações psíquicas persistirem por até um mês ajuda a explicar os efeitos positivos sobre transtornos mentais verificados experimentalmente após uma única dose. A psilocibina se encontra em testes preliminares para tratar não só depressão e ansiedade, pelo grupo de Roland Griffiths na JHU, mas também dependência de álcool e tabaco.

Trata-se de uma substância de uso proibido, mas estudos autorizados alçaram-na à condição de segunda droga controlada mais próxima de se tornar medicamento psiquiátrico (a primeira é MDMA, base do ecstasy). Até que a agência de fármacos FDA e congêneres como a Anvisa as aprovem, o que pode acontecer em menos de dois anos, ninguém vai conseguir tratamento legal com elas fora de instituições de pesquisa.

Apesar da proibição, os cogumelos Psilocybe são objeto de uso religioso há séculos, por exemplo no México; há décadas, por hippies; e, mais recentemente, por nerds no Vale do Silício e operadores no mercado de capitais. Não é difícil encontrar esses fungos na internet ou num pasto bovino após a chuva, mas identificá-los nada tem de trivial.

Cogumelos da espécie Psilocybe cubensis, que contém a substância psicodélica psilocibina (Divulgação)

Griffiths e seu grupo pioneiro em pesquisa psicodélica usaram uma dose alta de psilocibina nesse estudo, 25 mg por 70 kg de peso dos 12 pessoas saudáveis, sem transtornos mentais. Uma amostra pequena, decerto, mas que rendeu resultados dignos de nota.

Os voluntários foram submetidos a várias baterias de testes (questionários padronizados) para avaliar quantitativamente seu estado mental, como emoções positivas e negativas. Contrariamente ao que acontece com pessoas cronicamente deprimidas, constataram aumento das primeiras e redução das últimas.

Esse padrão benigno, entretanto, se manifestou somente no prazo de uma semana. Nos questionários respondidos depois de 30 dias, os participantes retornaram aos escores medidos antes da dose de psilocibina.

Os efeitos promissores após um mês foram observados por meio de ressonância magnética funcional (fMRI, abreviação em inglês pela qual é mais conhecida na neurociência). As imagens dinâmicas de atividade cerebral mediram as reações dos voluntários diante de estímulos emocionais, além de registrar quais áreas do cérebro estavam interagindo com quais outras.

O time da JHU constatou o surgimento de novos padrões de comunicação entre regiões cerebrais, o que pressupões novas conexões entre neurônios. Esse aumento da neuroplasticidade explicaria o benefício para quem sofre de transtornos mentais caracterizados pela rigidez e ruminação de ideias ou sentimentos negativos.

Em termos metafóricos, seria o caso de comparar a mente deprimida, por exemplo, com um computador que repete as mesmas falhas ao rodar programas muito antigos. A pessoa fica presa num ciclo vicioso de pensamentos ruins.

A psilocibina funcionaria, então, como um reset. Nessa analogia, a droga permitiria a entrada em linha de novos circuitos neuronais e, com sorte, a abertura de uma janela psíquica para vislumbrar novas maneiras de processar as dores e os males da alma.

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