Virada Psicodélica https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br Novidades da fronteira da pesquisa em saúde mental Wed, 01 Dec 2021 01:26:07 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Brasileiros reforçam pesquisa com o psicodélico ibogaína para dependência https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/08/23/brasileiros-reforcam-pesquisa-com-o-psicodelico-ibogaina-para-dependencia/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/08/23/brasileiros-reforcam-pesquisa-com-o-psicodelico-ibogaina-para-dependencia/#respond Mon, 23 Aug 2021 22:03:32 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2020/12/OXIemRioBrancoDanielMarencoFolhapress2011-300x200.jpg https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=579 “Chega uma hora que a gente cansa de usar, muitas vezes ficava com o cachimbo [de crack] na mão, chorando e pensando: ‘Não tô querendo, mas tô usando’. Nossa, é uma tristeza, um sofrimento mesmo.”

Os depoimentos de dependentes de crack, como este de Luan (nome fictício), são sempre doloridos e penosos de ouvir. Não foi recolhido pelo blog, mas pelo psicólogo Bruno Ramos Gomes, para a tese de doutorado defendida em maio na Unicamp (houve breve referência ao trabalho aqui no blog, em post anterior, “Como a ibogaína está ajudando uma jornalista a retomar controle da vida”.

Título da tese: “O Uso da Ibogaína no Manejo da Dependência de Drogas no Brasil: Um Estudo Qualitativo de Seguimento por Um Ano” (ainda não está disponível em biblioteca digital, mas o link será incluído aqui assim que aparecer). Eis uma contribuição importante para saber em que contextos o Brasil se tornou o país com talvez a maior experiência na aplicação do composto de origem africana para tratar abuso de substâncias.

Gomes faz parte de uma das equipes que preparam testes clínicos controlados com ibogaína em terapia para dependentes brasileiros, com epicentro no Instituto de Psiquiatria da USP em São Paulo e capitaneada pelo psiquiatra André Brooking Negrão. O outro grupo tem Rafael Guimarães dos Santos e Jaime Hallak à frente, na USP de Ribeirão Preto.

Santos e Hallak acabam de lançar no periódico Psychopharmacology, com colaboradores da Espanha, uma revisão internacional de 18 estudos publicados entre 2015 e 2020 sobre efeitos adversos da ibogaína. O levantamento agrega um caso novo de morte aos 33 arrolados em revisões anteriores (há outro óbito ocorrido no Brasil, não publicado).

O estudo dá detalhes dos problemas cardíacos, convulsões e sintomas menores (zumbido, vômito, diarreia) que podem acompanhar a viagem onírica com extratos da planta Tabernanthe iboga. Arritmias ocorrem em casos raros, mas são controláveis se o paciente estiver monitorado por pessoal médico. O artigo conclui pela necessidade de testes clínicos de fase 1 para refinar o conhecimento sobre uso seguro da ibogaína.

Iniciativa 81
Tabernanthe iboga, planta de origem africana de cuja raiz se extrai a ibogaína, uma das drogas que poderão ser descriminalizadas em Washington, DC (Marco Schmidt/Creative Commons)

Esse é um dos problemas da popularização de terapias para dependentes com iboga no Brasil, como relata Gomes: nem todo atendimento se dá em condições favoráveis.

É provável que boa parte deles tenha sido tratado com segurança pelo médico Bruno Rasmussen Chaves, com internação por 24 horas e monitoramento cardíaco contínuo. Esse foi o primeiro dos contextos documentados na tese de doutorado da Unicamp orientada pelo psiquiatra Luís Fernando Tófoli.

Chaves já tratou mais de 2.000 pessoas em um quarto de século de experiência com terapia psicodélica em Santa Cruz do Rio Pardo e depois Ourinhos, no interior paulista. Ele segue à risca normas da Anvisa para importar a droga com alto grau de pureza, processo burocrático específico para cada paciente. Nunca teve um caso fatal.

A segunda situação de pacientes entrevistados por Gomes na tese é parecida, mas com diferenças importantes. O autor não nomeia a instituição, mas meu livro “Psiconautas – Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira” (Fósforo Editora) indica que se trata do Instituto Brasileiro de Terapias Alternativas (IBTA), de Paulínia, outra cidade paulista, que alega o dobro de atendimentos de Chaves e registrou em 2016 uma morte horas após aplicação de ibogaína.

Menos controlado se mostra o uso do composto nos outros contextos exemplificados na tese, indivíduos e grupos que o utilizam como recurso contra dependência química numa zona cinzenta entre terapias e cerimônias religiosas com a ayahuasca. O perigo aumenta, e não se descarta que outras mortes tenham acontecido nesse circuito paralelo da ibogaína, não documentadas.

Gomes conclui que “alguns dos problemas enfrentados pelos participantes mostram riscos que devem ser levados em conta no uso da ibogaína e também em futuras regulamentações do seu uso, principalmente em relação a triagem e preparo do paciente, administração e dosagem da ibogaína e suporte durante o efeito agudo”.

O forte da tese, para interessados no aspecto subjetivo (“fenomenológico”, no jargão da ciência psicodélica), são os cinco relatos de dependentes que o psicólogo acompanhou por um ano, com entrevistas trimestrais. Um dos mitos que se desfaz com a leitura é o da ibogaína como panaceia ou bala de prata para exterminar a dependência.

Os pacientes saem melhores da experiência e descrevem como passaram por uma renovação da própria vida, mas não se livram do crack num passe de mágica. Chico (nome fictício), por exemplo, chegou a crer que encontrara a cura, como descreveu na primeira entrevista três meses de acompanhamento:

“Eu falei que me vi no uso [de crack], no dia da dose alta [de ibogaína]. Fiquei com dó de mim mesmo… Me vi desde pequenininho. Como me tornei isso?” –relatou a Gomes. “Venho de 12 internações, 20 anos de uso de crack. Eu às vezes lembro, mas não dá um trisco de vontade, nada! A memória não vem muito também. É como se eu nunca tivesse usado.”

Depois disso Chico teve recaídas esparsas, tomou ibogaína mais algumas vezes, porém com menos efeito. Procurou ajuda também na ayahuasca. Nas conversas subsequentes, já não dizia acreditar estar curado da dependência, mas sim amadurecido:

“Me tornei uma pessoa melhor, mais regrada. Nunca fui desonesto, nunca fui de mexer nas coisas do outro, mas agora tô até meio chato nessa parte. Fiquei até meio velho… Acho que amadureci. Pude me sentir uma pessoa que se resolveu com ela mesma. Ficava esperando felicidade e perguntando de onde ela ia vir… E ela tá aqui comigo. Consegui ficar feliz com o que eu já tinha.”

É de mais histórias e relatos como esse, tocantes e lúcidos, que a ciência psicodélica nacional precisa. Além, claro, de resultados sólidos da pesquisa rigorosa que pôs o Brasil na terceira posição entre os que produzem mais artigos científicos de alto impacto.

Só assim será possível vencer o preconceito que joga os psicodélicos na vala comum das drogas “demoníacas” e impede o avanço que alguns de nosso melhores cientistas perseguem, em favor da saúde mental, não sem risco para a própria carreira e reputação.

PARA SABER MAIS

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Como a ibogaína está ajudando uma jornalista a retomar controle da vida https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/08/16/como-a-ibogaina-esta-ajudando-uma-jornalista-a-retomar-controle-da-vida/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/08/16/como-a-ibogaina-esta-ajudando-uma-jornalista-a-retomar-controle-da-vida/#respond Mon, 16 Aug 2021 19:49:30 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/08/IbogaGiselleCamargo-287x215.jpeg https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=568 Aos 37 anos, a catarinense Giselle Camargo não tem do que reclamar, ao menos em aparência: jornalista bem-sucedida fora do eixo SP-RJ-DF, diretora e apresentadora do podcast pioneiro Anticast (criado em 2011, está na origem da série de TV “Caso Evandro”), mãe de um menino de cinco anos morando numa das capitais com melhor qualidade de vida (Curitiba).

Em 2018, ano da eleição de Jair Bolsonaro, angustiada com a situação política e fantasmas próprios, passou a beber, entornando mais de uma garrafa de vinho por dia. Sentia esvair-se o controle da própria vida, do peso, do sono, da depressão. Tomou a decisão de reagir, e buscou na ibogaína ajuda para tirar o pé do lodo existencial em que chafurda o país: “Estamos todos doentes no Brasil”.

Cresceu numa família adventista de São Francisco do Sul (SC), onde o pai era sindicalista. Drogas não faltavam na cidade portuária. Conviveu com mais de um parente dependente químico.

Aos 23 anos partiu sozinha para São Paulo, onde teve contato com maconha, ecstasy e cocaína, sem apegar-se a nenhuma delas. “Tomei um quarto de LSD e foi horrível, muito medo.” Remédios para emagrecer eram uma constante desde os 14 anos. Em 2009 começou a tomar antidepressivos.

Com o casamento e a gravidez, a jovem de 1m72 engordou e chegou aos 127 kg. Uma cirurgia bariátrica a devolveu para 69 kg, mas ela começou a beber, algo não incomum em quem faz a cirurgia de redução do estômago. O ponteiro da balança voltou a subir: 72, 74, 78 kg.

Na pior fase, estava bebendo já de manhã, mesmo de ressaca. Seguia trabalhando normalmente e decidiu que ia mudar a vida de “alcoolista funcional”, como se define. Não se animou com tratamentos convencionais, pouco eficazes. Aí se lembrou da recomendação de um psiquiatra a um parente, anos antes, de terapia com ibogaína para dependência química.

Iniciativa 81
Tabernanthe iboga, planta africana de cuja raiz se extrai a ibogaína(Marco Schmidt/Creative Commons)

“Estou velha, no sentido de mais madura. Fui atrás. Já deu. Não tem como não dar [certo]”, contou Giselle ao blog no final de maio. Essa primeira conversa ocorreu quatro dias antes de sua sessão com ibogaína em Ourinhos (SP), aos cuidados do médico Bruno Rasmussen Chaves e do psicólogo Bruno Ramos Gomes, aos quais chegou depois de muita pesquisa, como convém a uma jornalista.

O primeiro passo foram consultas remotas de preparação, com Gomes. Falou de seu medo de morrer e deixar o filho sozinho, caso algo acontecesse com ela e o marido em trânsito para o interior paulista.

Recebeu esclarecimentos sobre o baixo risco do procedimento, que Chaves compara com o de uma pequena cirurgia, e preferiu deixar uma carta para o menino explicando o propósito da viagem. No dia 1º de junho tornou-se uma entre mais de 2.000 pacientes tratados com ibogaína pelo médico.

Chaves, um gastroenterologista, começou a ministrar o composto da planta africana Tabernanthe iboga em 1994. Travou contato com o potencial terapêutico do extrato em encontro casual com Howard Lotsof, ex-dependente que abandonou a heroína e se tornou apóstolo da ibogaína nos Estados Unidos, onde ela permanece proibida (no Brasil se veda o comércio, mas a Anvisa admite importação, caso a caso, da droga não regulamentada).

Um pouco dessa história vai contada no quarto capítulo do livro “Psiconautas – Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira” (Fósforo Editora), em que falo também do uso da iboga no culto Bwiti do Gabão. Nos próximos dias a newsletter MAPS Bulletin  publicará artigo sobre iniciativas pioneiras de pesquisadores brasileiros com ibogaína para drogadição.

O leitor também pode informar-se diretamente com Chaves, Gomes e o psiquiatra André Brooking Negrão, colaboradores num ensaio clínico da USP sobre dependência de crack e cocaína que participaram em 15 de julho de uma conversa sobre ibogaína organizada por Chacruna Latinoamérica.

Giselle tomou às 8h30 uma dose moderada de hidrocloreto de ibogaína (12 mg por quilo de peso), na versão semissintética com 99% de pureza da empresa Phytostan utilizada por Chaves, que mantém seus pacientes em observação por 24 horas na Santa Casa de Ourinhos. Em ambiente hospitalar, com monitoramento contínuo, fica mais fácil intervir no caso de raras arritmias cardíacas, que podem ser fatais.

Há registro de 33 mortes no mundo após ingestão de ibogaína, em geral associadas com doenças cardíacas preexistentes ou uso concomitante de outras drogas, como heroína e cocaína. Chaves nunca teve um caso de complicação grave assim.

A jornalista passou então pelas três fases características do efeito do alcaloide. Após uma hora, começou a sentir uma vibração intensa e, em seguida, tontura e zunido no ouvido, recebendo a recomendação de permanecer deitada.

Precisou de ajuda de uma enfermeira para caminhar até o banheiro. Batimentos cardíacos subiram para 89 por minuto, quando seu normal é 65-70, mas achou que era muito mais. “Aí eu caí, uma sensação no estômago, caindo no escuro, como num filme do Tim Burton.”

Era a segunda etapa, comumente descrita como inundação de pensamentos. “Eu chamaria de loucura, loucura, loucura”, conta Giselle. As primeiras imagens a passar na tela dos olhos fechados foi do marido, depois irmã, mãe e, apesar de poucas imagens da infância relatadas por outros psiconautas, uma senhora negra centenária de quando era criança, dona Alaíde.

“Pessoas para quem tenho de pedir perdão”, diz. “Chorei muito, muito. Estava sofrendo de olhos fechados. Experiências premonitórias muito doloridas.” Mas Giselle se sentia no comando da própria viagem, que lhe rendeu lampejos felizes: “Tive a sorte de ter uma mãe que gargalha”.

A bebida não apareceu em primeiro plano. Como diz Gomes, que defendeu em maio uma tese de doutorado na Unicamp sobre 12 pacientes tratados com ibogaína, ela não traz o que a pessoa quer, mas sim o que a pessoa precisa.

Giselle entrou na terceira etapa, de reflexão, que se estendeu por pelo menos 72 horas, com duas convicções. Uma: “Sou uma pessoa muito boa, apesar de ter magoado muita gente. Antes era muito crítica, achava ruim tudo que fazia”. Outra: “O que passou, passou; não vou conseguir voltar no tempo”.

Ela não encontra palavras para descrever o pico do efeito. “É inefável, não consigo dizer. Surreal. Pesado. Difícil”, afirma. “Espero nunca mais fazer isso de novo. É foda, foda, foda. Se não estiver muito preparada, é de endoidecer. Já saltei de paraquedas, e é mais difícil, é se jogar no desconhecido.”

Dois meses e meio depois da sessão, o blog faz novo contato com Giselle. Como está? “Sigo firme e forte nos propósitos que tinha ao tomar a ibogaína.” E a bebida? “Não voltei a beber e quase nunca penso nisso. Já o cigarro é mais traiçoeiro. Não tem um dia desde então em que não pense em fumar. Sonho que estou fumando.”

Um de seus receios, agora, antecipa o dia em que a Covid passar –se passar: “Quanto ao álcool, tenho medo de que a retomada da vida social, algo que ainda está em suspenso por causa da pandemia, torne a decisão de parar mais difícil. De batismo a velório, temos rituais que envolvem a bebida alcoólica”.

Um dia desses Giselle abriu um vinho branco para fazer risoto. A garrafa segue aberta na geladeira.“Não chego nem a olhar.” O porém: “Tem essa coisa de tira a droga, no meu caso álcool, e resolve o problema. Não, né? O problema só muda de lugar.”

PARA SABER MAIS

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USP testa psicodélico ibogaína contra dependência de crack e álcool https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/04/29/usp-testa-psicodelico-ibogaina-contra-dependencia-de-crack-e-alcool/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2021/04/29/usp-testa-psicodelico-ibogaina-contra-dependencia-de-crack-e-alcool/#respond Thu, 29 Apr 2021 21:00:14 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2021/04/CRACKZANONEFRAISSAT2021-300x200.jpeg https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=433 A posição de destaque do Brasil em ciência psicodélica fica mais evidente com estudos da USP para combater dependência de crack/cocaína e álcool: há somente quatro ensaios clínicos duplo-cego registrados no mundo para novos testes da droga ibogaína, e dois deles acontecem aqui.

O composto originário da planta africana Tabernanthe iboga, é usado desde os anos 1960 para tratar crises de abstinência e interromper o uso compulsivo. Antes, era empregado em rituais da etnia bwiti, no Gabão e Camarões, e vendido como o antidepressivo Lambaréné na França, de 1939 a 1970, mas terminou abandonado quando se verificou o risco de arritmias cardíacas.

Tradicionalmente, a substância era obtida da raiz do vegetal. Hoje se utiliza a versão sintética purificada, cloridrato de ibogaína, nos estudos experimentais, em clínicas e grupos alternativos de tratamento.

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Tabernanthe iboga, planta africana da qual se extrai a ibogaína (Marco Schmidt/Creative Commons)

A ibogaína é proibida em vários países. No Brasil ela não aparece na lista de substâncias controladas nem está regulamentada para uso terapêutico. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) só permite importação individual, com indicação médica, embora não haja estudos conclusivos sobre sua eficácia.

Duas unidades da USP decidiram enfrentar o desafio para suprir essa deficiência na literatura científica, diante do acúmulo de indícios de sucesso no tratamento de dependência. Duas clínicas no interior paulista, por exemplo, reúnem casuística contendo milhares de pacientes e alegam taxas de sucesso da ordem de 60-70%.

André Brooking Negrão, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, lidera o estudo mais ambicioso. Em sua mira estão crack e cocaína, que levam dezenas de pessoas todos os meses a buscar socorro no ambulatório do Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas (GREA).

“O dia a dia de quem cuida de [dependentes de] crack e coca é muito infeliz”, diz Negrão, referindo-se às altas taxas de reincidência. “Resolvi fazer isso [pesquisa com psicodélicos] o resto da minha vida”, diz o psiquiatra de São Paulo, frustrado com a ausência de medicamentos comprovadamente eficazes para pacientes que desejam reduzir ou abandonar o consumo.

O teste de fase 2b, para verificar eficácia e segurança, envolverá 80 dependentes de crack ou cocaína (40 homens e 40 mulheres). Eles serão internados por dez dias, os sete primeiros para assegurar abstinência, o que será confirmado por exames toxicológicos.

Todos passarão por oito sessões de psicoterapia, quatro de preparação e quatro de integração (discussão dos conteúdos psíquicos aflorados durante a experiência com ibogaína), com participação de familiares. Esse é o protocolo usual de pesquisa com psicodélicos para transtornos psíquicos como depressão e estresse pós-traumático, os mais adiantados.

Como os psicodélicos clássicos LSD, psilocibina (“cogumelos mágicos”) e DMT da ayahuasca, a ibogaína atua sobre receptores do neurotransmissor serotonina, importante na regulação de humor, libido e outras funções. A viagem pode durar muito, até mais de 24 horas, e lança a pessoa num estado de sonho lúcido.

Alguns pesquisadores preferem qualificar a substância como oniroide, onirofrênica ou onirogênica. São frequentes relatos de quem revive sob seu efeito situações difíceis, como overdoses, e sensações de morte e renascimento. Também se manifesta intensa empatia com sofrimento alheio e o próprio, não raro acompanhada de remorso por perceber-se como fonte de ambos.

A descoberta de que a ibogaína também suprime efeitos dolorosos da abstinência se atribui a Howard Lotsof. Em 1962, o americano dependente de heroína experimentou a droga africana com a promessa de dois dias de viagem; quando voltou do transe, surpreendeu-se sem os sintomas físicos da síndrome de abstinência.

Lotsof tornou-se a partir daí um apóstolo da ibogaína. Em 1994, o gastroenterologista Bruno Rasmussen Chaves almoçou com ele no refeitório da Universidade de Miami, durante um estágio, e tomou conhecimento da droga, que passou a empregar para tratar dependentes três anos depois, primeiro em Santa Cruz do Rio Pardo e depois em Ourinhos, ambas cidades paulistas.

O médico interna pacientes na Santa Casa, onde os monitora durante toda a viagem, para intervenção imediata em caso de arritmia cardíaca. Nunca teve um caso fatal, informa. Centenas de tratamentos depois, Chaves é hoje um dos colaboradores de Negrão no teste clínico.

“A administração do cloridrato de ibogaína no Brasil tem sido feita com base em protocolos inconsistentes quanto às doses terapêuticas, ao grau de pureza da ibogaína administrada e à adequação do suporte médico”, adverte Negrão a respeito de centros de tratamento alternativo.

“Há relatos na literatura de mortes associadas com o uso concomitante de ibogaína e outras substâncias psicoativas, além de um possível risco intrínseco da substância sobre a condução cardíaca.”

O pesquisador Geoffrey Noller, da Nova Zelândia, encontrou relatos de 19 mortes ocorridas entre 1990 e 2008 no prazo de três dias após ingestão de ibogaína. A maioria vitimou pessoas com problemas cardíacos prévios ou em decorrência de interação farmacológica com outras drogas cujo abuso não fora interrompido.

Em 2016 um grupo neozelandês liderado por Paul Glue publicou ensaio com 27 voluntários dependentes de opioides tratados com um composto aparentado, noribogaína, metabólito ativo no corpo de quem ingere ibogaína. O estudo teve a colaboração das empresas americanas DemeRx e iCardiac.

A comparação com o grupo de controle na USP, metade das mulheres e dos homens a serem recrutados que não receberá ibogaína, só psicoterapia, permitirá afirmar com segurança estatística se o psicodélico de fato surte efeito sobre a dependência. Afinal, melhoras espontâneas acontecem, oriundas de expectativa (efeito placebo) ou da determinação da pessoa para abandonar a droga.

Os pacientes e seus familiares serão acompanhados por três meses no ambulatório. Depois disso, por um ano, serão monitorados remotamente.

O estudo estava pronto para começar, com aprovação de comitês de ética, em maio do ano passado. A pandemia de Covid-19 inviabilizou o uso dos leitos oferecidos pelo Instituto de Psiquiatria e restringiu o fornecimento de ibogaína proveniente da Índia. Negrão afirma que o recrutamento será rápido assim que as vagas ficarem disponíveis novamente e a importação for retomada.

Garrafas de cerveja em depósito para reciclagem (Foto: Rogério Assis/Folhapress)

A eclosão da pandemia também atrapalhou o início do outro ensaio clínico da USP, aprovado e registrado ainda em 2017,  neste caso pelo grupo de neurociência e ciências do comportamento liderado por Jaime Hallak na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. O investigador principal do experimento é Rafael Guimarães dos Santos.

O estudo de Ribeirão não tem relação com o de São Paulo. Testará a tolerabilidade da ibogaína, com um grupo de apenas 12 pessoas, para outro tipo de dependência, alcoolismo. Segundo Santos, o álcool foi escolhido por causa da alta prevalência do abuso dessa substância legal no Brasil, que afeta cerca de 10% da população.

O desenho do experimento é bem diferente. Voluntários ficarão internados por 20 dias, e os primeiros três pacientes receberão três doses sucessivas e crescentes de ibogaína; não havendo efeitos adversos, os outros nove receberão a droga ou placebo, por sorteio.

O consumo de álcool pelos participantes será então acompanhado a cada semana no primeiro mês. Depois disso, nos 3º, 6º e 12º meses.

O primeiro estudo controlado do mundo com ibogaína estava planejado para acontecer na Espanha, onde Santos fez seu doutorado de 2006 a 2012 com o conhecido estudioso de psicodélicos Jordi Riba (morto em agosto de 2020). Outra morte, de Manel Barbanoj, que conduziria o ensaio com José Carlos Bouso, adiou os planos.

Assíduos colaboradores de Bouso, Hallak e Santos combinaram com ele efetuar o teste clínico no Brasil. Em paralelo, os brasileiros colaborarão com o pesquisador espanhol na realização de ensaio parecido, mas no tratamento da dependência de metadona, droga utilizada para redução de danos com dependentes do opioide heroína.

O quarto estudo clínico com ibogaína em preparação no mundo ocorrerá no Reino Unido. As empresas DemeRx e Atai Life Sciences tiveram sinal verde da agência reguladora britânica MHRA para testar a droga no tratamento justamente de dependentes de opioides.

O plano dos empresários britânicos é recrutar 110 voluntários, no total: primeiro 30 saudáveis (usuários recreativos de drogas), para estabelecer a segurança do composto, e 80 adictos numa segunda etapa, já com vistas à desintoxicação.

O fato de metade dos testes clínicos com ibogaína se realizarem no Brasil não é de todo surpreendente. O país tem tradição de pesquisa com psicodélicos, em especial DMT e outras substâncias da ayahuasca, facilitada pela legalização de seu uso em religiões como Santo Daime, Barquinha e União do Vegetal (UDV).

Na voga atual de trabalhos científicos após meio século da fracassada Guerra às Drogas liderada pelos EUA (1971), o chamado renascimento psicodélico, brasileiros têm se destacado. Num levantamento de artigos maior impacto (número de citações), o Brasil ficou em terceiro lugar, após EUA e Reino Unido.

O composto mais estudado fora daqui é a psilocibina dos cogumelos Psilocybe, além de LSD e MDMA, para uma série de condições, como depressão (fase 2) e estresse pós-traumático (fase3). A ayahuasca motivou o primeiro teste clínico controlado por placebo de um psicodélico para depressão após o renascimento, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), publicado em 2018.

A ibogaína tem sido menos pesquisada, apesar do volume de relatos observacionais de sucesso no tratamento de dependência, por causa dos riscos cardíacos e das mortes, ainda que raras. Mas seu uso com acompanhamento médico, como em Ourinhos, tem demonstrado segurança suficiente para uma instituição como a USP se lançar na pesquisa.

A logística, entretanto, encarece o ensaio clínico, pela necessidade de internação e garantia de que os voluntários não tenham no organismo drogas que possam interagir com a ibogaína e afetar o coração. Só com os leitos para o estudo com usuários de crack Negrão orçou despesa de R$ 336 mil, já autorizada pelo Instituto de Psiquiatria (e adiada pela pandemia).

Um dos fatores para o interesse brasileiro pela ibogaína, cita Negrão, esteve em estudo retrospectivo (não controlado) publicado por Bruno Chaves e Eduardo Schenberg em 2014. “Houve um boom de clínicas fazendo iboga no Brasil”, diz.

O artigo descreve levantamento com 75 dependentes de álcool, maconha, cocaína e crack. Cinco meses após tratamento com ibogaína, 61% ainda estavam em abstinência.

Para Rafael dos Santos, da USP em Ribeirão Preto, o interesse do grupo de Jaime Hallak está em expandir as linhas de pesquisa. “A experiência acumulada com estudos de ayahuasca nos últimos quase 20 anos, aqui, nos trouxe o conhecimento para desenvolver pesquisas com esse tipo de substâncias que modificam profundamente a consciência.”

Santos enxerga como vantagem comparativa do Brasil a experiência com ayahuasca e ibogaína, que enfrentam mais restrições legais noutros países. “Por outro lado, temos mais dificuldades para realizar estudos com psilocibina e LSD.”

Os líderes dos testes clínicos reconhecem preconceito na academia com ciência psicodélica, mas não a ponto de dificultar a aprovação dos ensaios por comitês de ética. A liderança nacional nessa área efervescente da pesquisa mundial, entretanto, pode ainda sofrer com o clima político e ideológico no país polarizado.

A ibogaína entrou no radar do governo Jair Bolsonaro. Em reação ao emprego de ibogaína em comunidades terapêuticas para dependentes, a Secretaria Nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas, do Ministério da Cidadania, baixou em agosto a nota técnica nº 64 ameaçando-as com descredenciamento e suspensão de contratos de prestação de serviços com o governo federal.

“Felizmente, as pesquisas com alucinógenos psicodélicos são vistas como pesquisas, sem tanto teor ideológico. Isso se deve em grande parte à seriedade dos grupos de pesquisa”, afirma Rafael dos Santos. “Somente com seriedade e rigor vamos avançar nessa área.”

Os dois estudos da USP serão apresentados ao público internacional na próxima edição do Maps Bulletin (no prelo), publicação quadrimestral da Associação Multidisciplinar de Estudos Psicodélicos dos EUA. Trata-se da ONG responsável pelo teste clínico mais adiantado (fase 3) do mundo com terapia psicodélica para transtorno psiquiátrico (no caso, MDMA e estresse pós-traumático).

Curso “História das drogas psicodélicas para uso medicinal e sua demonização”, no site Bora Saber.

 

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‘Ibogaína’ não alucinógena mantém potencial contra dependência química https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2020/12/14/ibogaina-nao-alucinogena-mantem-potencial-contra-dependencia-quimica/ https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/2020/12/14/ibogaina-nao-alucinogena-mantem-potencial-contra-dependencia-quimica/#respond Mon, 14 Dec 2020 14:39:46 +0000 https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/files/2020/12/OXIemRioBrancoDanielMarencoFolhapress2011-300x200.jpg https://viradapsicodelica.blogfolha.uol.com.br/?p=169 Pesquisadores da Universidade da Califórnia realizaram a façanha de criar uma versão do psicodélico ibogaína que não causa alucinações, aparentemente, nem importa risco para o coração. Se conseguirem comprovar eficácia em seres humanos, seria uma grande promessa para o tratamento de dependência química.

Ibogaína é uma substância psicoativa derivada do arbusto Tabernanthe iboga, usado ritualmente pela etnia Bwiti, em países africanos como o Gabão e Camarões.  Ela lança a pessoa num estado onírico que pode durar um dia inteiro, ou mais.

Nos anos 1960, descobriu-se nos EUA sua capacidade de diminuir sintomas agudos da crise de abstinência em dependentes de heroína e de conter a urgência imperiosa de consumir a droga (“fissura”). Apesar de proibida, alguns países –como o Brasil– admitem o uso excepcional da ibogaína como tratamento para dependência química, com taxas de sucesso que chegam a superar 60%.

Iniciativa 81
Tabernanthe iboga, planta de origem africana de cuja raiz se extrai a ibogaína, uma das drogas que poderão ser descriminalizadas em Washington, DC (Marco Schmidt/Creative Commons)

O médico Bruno Rasmussen Chaves, de Ourinhos (SP), administrou o composto a centenas de pacientes, assim como o Instituto Brasileiro de Terapias Alternativas (IBTA), em Paulínia (SP). É mais que recomendável contar com acompanhamento médico durante a viagem da ibogaína, porque a droga afeta o ritmo do coração e pode ser fatal, cuidado nem sempre disponível em clínicas clandestinas.

Na literatura médica há registro de 22 mortes após uso da substância entre 1990 e 2015. Uma revisão de 19 casos de óbito após ibogaína indicou em 2012 que 12 dos 14 deles para os quais havia prontuários médicos detalhados envolviam distúrbios cardíacos prévios ou consumo concomitante de outras drogas, como cocaína.

O laboratório de David Olson na Universidade da Califórnia descreveu na revista Nature da semana passada como foi capaz de modificar a molécula de ibogaína e chegar à síntese de um análogo da substância que os autores afirmam não ser alucinógeno. Chamaram o composto de tabernanthólogo (TBG) e sustentam que a variante não altera perigosamente batimentos cardíacos, tampouco.

“É um trabalho revolucionário”, diz o neurocientista Dráulio Araújo, do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), que pesquisa efeitos terapêuticos da ayahuasca. “Abre a possibilidade única de investigar melhor quanto do efeito terapêutico nasce da bioquímica e quanto da experiência subjetiva em si [referindo-se ao estado onírico].”

A equipe de Olson, no entanto, testou o novo composto apenas com roedores. Outras substâncias psicodélicas que também atuam sobre o receptor 5HT2A para o neurotransmissor serotonina, como LSD e psilocibina, provocam nos bichos um movimento característico da cabeça aceito por pesquisadores como correlato de alucinações.

Os experimentos mostraram que o TBG promove neuroplasticidade, ou seja, a formação de novas conexões entre neurônios que se acredita estar na origem dos benefícios terapêuticos de psicodélicos. Além disso, testes padronizados provaram que o TBG também reduz nos animais o consumo compulsivo de álcool e heroína, além de produzir efeitos análogos a antidepressivos.

Crescimento de espículas em dendritos de neurônios (setas azuis) indica neuroplasticidade após ibogaína (esq.) e TBG (dir.) (Reprodução da Nature)

O artigo indica ainda que obter TBG é mais simples que produzir ibogaína, pois a síntese química envolve apenas um passo, contra 9 a 16 para o composto original, e rende mais. Em resumo, projetaram uma droga que parece ter a mesma capacidade da ibogaína de tratar dependência química, mas desprovida do que chamam de “inaceitável perfil de segurança” –só falta comprovar isso em seres humanos.

“Ratos não têm experiências místicas”, brinca Araújo, da UFRN, para indicar que o trabalho de Olson e colegas toca num ponto nevrálgico do renascimento dos psicodélicos como drogas alternativas promissoras para tratar transtornos mentais: pressupõe-se que os conteúdos psíquicos produzidos ou aflorados durante as viagens sejam imprescindíveis para o progresso terapêutico.

Um estudo sobre ibogaína de Thomas Brown, Geoff Noller e Julie Denenberg no periódico Journal of Psychoactive Drugs defende que o efeito onirogênico da droga é decisivo para quebrar a dependência, ou pelo menos tão importante (pelas memórias e traumas que permite aflorar e que ficam disponíveis para elaboração psíquica das raízes da dependência) quanto o efeito farmacológico (neuroplasticidade).

A pergunta que Olson suscita é se, ao supostamente deletar o impacto alucinógeno, a TBG também não arriscaria cortar pela metade o potencial terapêutico antidependência. Restando apenas a modulação bioquímica, centrada no receptor serotoninérgico 5HT2A, o sonho de livrar-se da dependência talvez não se materialize em pessoas.

Araújo conta que, no caso do estudo de seu grupo que mostrou efeito antidepressivo rápido e duradouro da ayahuasca contra depressão, ambos os ingredientes –farmacologia e vivência subjetiva– parecem contribuir para o resultado terapêutico. Além disso, o efeito psicodélico não se resume ao alvo 5HT2A, e substâncias psicoativas atuam sobre vários outros receptores e sistemas, cada uma com um perfil peculiar.

O neurocientista brasileiro aponta, para reforçar seu raciocínio sobre a complexidade dos efeitos, que há mais serotonina espalhada pelo organismo do que no cérebro. No entanto, psicodélicos agem mais sobre a mente do que no restante do corpo.

Nicole Galvão-Coelho, coautora de Araújo na pesquisa sobre depressão, já demonstrou a capacidade da ayahuasca de modular tanto a neuroplasticidade quanto níveis de cortisol (hormônio do estresse) e um efeito anti-inflamatório.

O LSD, por seu lado, tem forte influência sobre a dopamina. Cetamina e escetamina, sobre o glutamato. MDMA, sobre a noradrenalina.

“Efeitos psicodélicos não estão necessariamente associados só com o receptor 5HT2A, é uma simplificação. Existem vários antidepressivos que atuam sobre a serotonina e não provocam experiências visuais”, ressalva Araújo. “Há outras danças por trás dos psicodélicos.”

Argumento parecido apareceu numa série de tuítes do psicólogo Matthew Johnson, do Centro para Pesquisa Psicodélica e da Consciência da Universidade Johns Hopkins: “Há um pouco de debate sobre o alvo errado. [Olson] não defende que efeitos subjetivos não possam ser terapêuticos. Provavelmente há múltiplos mecanismos subjacentes à eficácia da terapia psicodélica, e formas de neuroplasticidade podem ser uma delas”.

“Precisamos nos afastar de falsos debates entre experiência/psicologia e biologia, e pensar de maneiras mais nuançadas. A experiência, afinal de contas, tem uma biologia também.”

A antropóloga brasileira Bia Labate, do Instituto Chacruna na Califórnia, se incomoda com abordagens muito reducionistas da questão: “A ciência procura separar os efeitos e chegar na suposta ‘essência’ da ‘cura’. A busca por uma droga ‘clean’, sem efeitos alucinógenos, deve ser entendida dentro de um cenário maior”, defende.

“Por um lado, uma tentativa moral de eliminar os supostos aspectos alucinógenos da experiência, que são vistos com ‘negativos’ ou ‘errados’. E, por outro, em função de interesses econômicos, isto é, patentear certos achados.”

Labate esteve em 2001 em Camarões para conhecer em profundidade os rituais da iboga. Do ponto de vista das populações tradicionais, de onde essas substâncias provêm, a cura é holística, explica.

“As concepções de enfermidade envolvem não só aspectos físicos, mas a relação dos humanos entre si, e entre humanos e não humanos. A cura advém da comunhão de plantas, que contêm múltiplos alcaloides, e da experiência mística e coletiva.”

 

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