Estudo britânico confirma potencial do MDMA para tratar abuso de álcool

Antes de ser banido da farmacopeia psiquiátrica nos anos 1970, o LSD deu bons resultados em clínicas para tratar uso abusivo de álcool, em especial no Canadá. As pesquisas com ácido estão retornando, mas pesquisadores no Reino Unido investem em outra substância psicoativa, o MDMA (ecstasy), para tratar a condição que mata 3 milhões por ano no mundo.

Os estudos ainda são preliminares. Em 2019, a equipe de Ben Sessa no Imperial College de Londres já havia apresentado indicações animadoras com 11 pacientes. Agora, com um grupo um pouco maior (14), confirmou potencial encorajador.

O trabalho saiu dia 18 no periódico Journal of Psychopharmacology, sob o título “Primeiro Estudo de Segurança e Tolerabilidade de Psicoterapia Assistida por 3,4-Metilenodioximetanfetamina em Pacientes com Transtorno de Uso de Álcool”. Depois de desintoxicados, os 14 voluntários passaram dois meses em terapia, incluindo duas sessões em que tomaram 187,5 mg de MDMA, na terceira e na sexta semana.

Em seguida, os 8 homens e 6 mulheres foram acompanhados por nove meses. Ao final do período, verificou-se que seu consumo médio de álcool se reduzira em 86% –em 11 dos 14 casos, para níveis comparáveis ao chamado consumo social.

Pílulas de ecstasy (MDMA) usadas em baladas (Divulgação/DEA)

O MDMA tem sobre o LSD e outros psicodélicos “clássicos” a vantagem de não desencadear manifestações visuais, efeito que poderia afastar da possível terapia pessoas com receio da experiência completa de dissolução do ego que substâncias como o ácido, a psilocibina de cogumelos e o DMT da ayahuasca podem ocasionar. Por causa dessa diferença, há quem defenda que o composto de base do ecstasy deve ser classificado como “empatógeno”, e não “psicodélico”.

O forte do MDMA está no derrame de empatia que provoca na pessoa, predispondo-a para a psicoterapia. O efeito, sob esse aspecto, é similar ao de outros psicodélicos, razão pela qual eles vêm sendo estudados no tratamento de depressão, ansiedade e traumas –não por acaso condições que muitas vezes subjazem ao consumo abusivo de álcool.

No retorno triunfal dos psicodélicos ao proscênio psiquiátrico, o ecstasy tem papel de destaque. É a droga mais próxima de alcançar aprovação como tratamento da FDA, a agência de fármacos dos Estados Unidos, com estudos de fase 3 em vias de consagrar o MDMA como terapia para transtorno de estresse pós-traumático (TEPT).

A Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos (Maps, em inglês), patrocinadora deste clínico, foi estratégica na escolha de uma droga sem o estigma do LSD e de uma patologia que aflige 3,5% dos americanos, em especial veteranos de guerra. Políticos conservadores tendem a levantar menos obstáculos para pesquisas que objetivem minimizar o dano causado pelo TEPT a esses indivíduos e à sociedade, cujo custo anual pode chegar a US$ 30 bilhões (quase R$ 170 bilhões) nos EUA.

No Brasil, o MDMA foi empregado num estudo preliminar de pequeno porte para tratar vítimas de abuso sexual. Saiba mais sobre o trabalho neste resumo publicado em reportagem de Fernando Tadeu Moraes na Folha: