Um esclarecimento para o professor Jaime Hallak sobre este blog
Em minha última nota neste blog, divulguei a realização de um debate sobre psicodélicos, nesta manhã de quinta-feira (22), pelo Instituto de Psiquiatria da USP. Um dos convidados era Jaime Hallak, da USP de Ribeirão Preto.
Não pude ver a transmissão, mas soube que Hallak criticou a existência deste blog, embora sem nomeá-lo, nem ao autor (atitude não incomum entre acadêmicos brasileiros). Se visto agora a carapuça, é porque o professor disse uma inverdade que merece retificação.
Hallak afirmou que jornalistas como eu “defendem” os psicodélicos. Isso só seria verdade se noticiar pesquisas –como as que ele fez, pioneiramente, sobre ayahuasca– implicasse fazer propaganda das substâncias.
Em 15 de junho de 2018, por exemplo, escrevi objetivamente, sem ocultar seu caráter preliminar, sobre estudo da UFRN que demonstrou efeito benéfico rápido e duradouro da ayahuasca em pacientes com depressão resistente aos antidepressivos disponíveis.
Hallak, curiosamente, era um dos autores do trabalho. Citei no texto manifestação sua, extraída de um press release do grupo, a respeito da pesquisa: “ ‘Estamos muito animados com esses novos resultados’, disse em comunicado do grupo Jaime Hallak, outro coautor do estudo, professor de psiquiatria na USP” [ênfase minha].
Outro co-autor era Luís Fernando Tófoli, da Unicamp. Dele ouvi e reproduzi o seguinte na reportagem de 2018: “ ‘É importante assinalar que a ayahuasca como tratamento é experimental. Seu uso terapêutico ainda não está regulamentado’, ressalva Tófoli”.
No debate desta quinta-feira (22), Hallak acusou a mídia de entrevistar “pessoas” que dizem que “essas drogas são lindas e maravilhosas”. E que depois, em consequência disso, ele é procurado no consultório por gente que lhe pede prescrição de ayahuasca e ibogaína, substâncias que não estão autorizados para venda nem prescrição, só para uso científico.
Na sequência, o professor disse: “Esta semana um importante grupo jornalístico acabou de lançar um blog (…) falando que as pesquisas científicas sobre psicodélicos são tema de novo blog e que a cada 2 ou 3 dias um jornalista bastante importante vai pontuar e defender os [psicodélicos], onde se questiona quando o Brasil vai criar seu próprio centro de pesquisa”.
Ele se referia ao primeiro post deste blog. De fato, levantei o tema na forma de uma pergunta, que aparece no título, e afirmei ser uma questão de tempo universidades como a USP seguirem o caminho corajoso do Imperial College de Londres, da Universidade Johns Hopkins e da Universidade de Nova York.
A função do jornalista é noticiar o que for relevante, e creio que Hallak não negará a relevância de estudos com psicodélicos –como os que ele próprio realiza– para possíveis tratamentos de transtornos mentais. Claro, sempre ressalvando que ainda são pesquisas experimentais, não autorizadas para uso disseminado.
Cabe ao psiquiatra e ao pesquisador fazerem o mesmo, seja para repórteres, seja para pacientes. Todos os três –jornalistas, cientistas e profissionais de saúde– precisam caminhar juntos na direção de esclarecer o público sobre o funcionamento da ciência.
Hallak pode continuar contando com este blog na parte que me cabe.